Conto Guerras Táuricas

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Altemar Gavião
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Conto Guerras Táuricas

Mensagem por Altemar Gavião » 22 Mar 2016, 10:54

Olá pessoal,

Gostaria de convidar vocês a conferirem meu conto sobre Tormenta passado nas Guerras Táuricas.

A história se passa em dois diferentes períodos de tempo e os acontecimentos são mostrados pelos pontos de vista de dois personagens. O primeiro é Dario, um guerreiro humano que faz parte de um grupo de aventureiros que usa táticas de guerrilha para proteger a cidade de Malpetrim das constantes tentativas de invasão por parte do Império. Enquanto Lita é uma garota que nasceu escrava, filha de um importante general do exército imperial. Lita tenta entender sua situação em um reino que trata as mulheres como mercadorias e objetos de prazer.

Segue uma amostra:

Lita já havia ouvido falar a respeito do colégio militar, mas nunca o havia visto de perto. Era um complexo impressionante, ocupava um bairro inteiro da capital. A garota teve que caminhar por vinte minutos com o pai, ao longo de seus muros, antes de encontrar os portões principais. O motivo de ocupar tanto espaço era que a única edificação da região a possuir mais de um andar era a arena, e parecia ser para lá que seu pai a estava levando.

Lita havia deixado seu uniforme de esgrima para trás, agora vestia uma toga simples e leve, mas um pouco esvoaçante demais para o gosto dela, sandálias de tiras altas e joias. Sua mãe havia feito sua maquiagem, nada chamativo, apenas algo que ressaltasse a beleza que já estava lá.

"Aposto como vai ser outro daqueles eventos chatos", pensou Lita. Seu pai era convidado para muitos. Ele estava quase sempre fora, treinando e comandando as legiões, mas nos poucos meses do ano em que estava na capital, os políticos o sobrecarregavam com festas, banquetes e bajulação. Muitas vezes Lita e sua mãe iam com o pai a esses eventos, mas não como acompanhantes. Concubinas eram, mais que qualquer coisa, símbolos de status. Quanto mais bonitas, mais inveja e respeito traziam.

A mãe de Lita já passava dos trinta anos, mas poucas eram as mulheres mais jovens que rivalizavam com ela em beleza, nem mesmo Lita julgava que um dia seria tão bonita quanto a mãe. Então, ela atraia todos os olhares admirados por onde quer que fosse, mas ainda assim, havia perdido os benefícios de ser a preferida do harém, tudo porque não havia conseguido dar a seu pai filhos minotauros. Depois de Lita, sua mãe não voltou a engravidar. Seu antigo posto agora pertencia a Giovanna. Esta dava a Salustian um filho por ano, todos minotauros fortes. Tantas gravidezes consecutivas haviam cobrado o preço na beleza de Giovanna, mas como uma inesgotável fábrica de bebês saudáveis, Salustian continuava a procurá-la.

Quando Lita ia acompanhando a mãe àqueles eventos, elas sempre se juntavam as outras mulheres, para colocar a conversa em dia, enquanto eram colocadas de lado das discussões políticas. Lita procurou em volta por mulheres conhecidas, com quem poderia passar o tempo, mas se surpreendeu ao notar que não haviam outras concubinas lá. Quase todos os ocupantes do salão eram minotauros.

– Pai, o que viemos fazer aqui?

– Se lembra de meu filho, Riccardus?

– Sim – disse Lita revirando os olhos. Salustian tinham muitos filhos, mas apenas três em idade adulta. Salustian II era comandante da marinha mercante; Arthus havia virado um aventureiro andante; Victorius havia se tornado um político, e estava a caminho de se eleger senador. Nenhum deles havia seguido carreira na legião, para o desgosto do pai. Por isso Riccardus "o babão", como Lita o chamava, havia falado aos quatro ventos que se tornaria o primeiro filho de seu pai a seguir seus passos. Salustian morria de orgulho dele, mas Lita o achava uma criatura desagradável desde sempre.

Riccardus era o primeiro filho de Giovanna, dois anos mais velho que Lita e, quando criança, gostava de bater em suas irmãs menores. Lita era sempre quem tentava defender as outras, mas poucas chances tinha contra um minotauro com o dobro do seu peso. Fazia anos que ela não via Riccardus, desde que ele entrara para a escola miliar, e a garota agradecia a Tauron por isso, mas parecia que sua sorte estava acabando. Como se estivesse lendo seus pensamentos, Riccardus apareceu na multidão.

– General – disse ele fazendo continência para o pai.

– Filho – saudou Salustian.

Riccardus estava quase tão grande quanto o pai, embora ainda não tão musculoso. Ele usava o uniforme completo da legião, uma loriga segmentada, polida até brilhar, com um manto púrpura preso de lado. Ao lado dele estava um outro minotauro, igualmente alto, mas de pelagem mais clara e chifres menores.

– Veio assistir minha cerimônia de graduação? – Riccardus perguntou.

– Não poderia perder o dia em que meu filho se tronaria um legionário.

– Sou apenas um hastati. Isso é só o início do meu treinamento, ainda faltam dois anos até que eu me torne um centurião.

– Ainda assim é um evento importante.

Só nesse instante que Riccardus reparou na presença de Lita, e não pareceu satisfeito.

– Pai, pensei que o senhor traria minha mãe para assistir a cerimonia.

– Sua mãe está em estado avançado de gravidez. Não era bom para ela sair de casa.

Enquanto conversavam, o outro minotauro, que havia chegado com Riccardus, não parava de encarar Lita. A menina já estava ficando desconfortável com aquilo.

– Mas que falta de educação a minha – disse Riccardus. – Pai, o senhor já conhece Valérius?

– Como não conheceria o Primeiro Filho.

Primeiro Filho, pensou Lita, surpresa ao ouvir o título. Em Tapista o Primeiro Filho era o filho do Primeiro Cidadão, ou seja, do Princeps. Lita estava de frente para o herdeiro do trono.

– General Salustian – disse Valérius –, é uma honra revê-lo.

– Vejo que cresceu para se tornar um homem tão forte quanto seu pai.

– Nem tanto, general. Ainda me falta muito para que eu possa me comparar aquele minoaturo. Mas por falar no Princeps, eu pensei que ele estaria aqui com o senhor.

– Assuntos do reino o impediriam. Ele me mandou com suas condolências e como seu representante.

– Entendo – disse Valérius com um suspiro –, é uma honra ter o senhor para assistir minha cerimônia. – E nessa hora os olhos do Primeiro Filho se voltaram novamente para Lita. – Mas senhor, por favor, me diga quem é essa jovem tão encantadora que o está acompanhando, é sua serva?

– Valérius, está é Lita.

Lita fez uma reverência encabulada.

– O senhor tem muita sorte de ter tamanho tesouro em seu harém.

Riccardus revirou os olhos com o comentário.

– Ela não faz parte do harém de meu pai – disse Riccardus.

– Lita é minha filha – disse Salustian.

– Nesse caso – disse Valérius –, um dia ela fará parte do harém de alguém.

– Só daquele que se provar merecedor – disse Salustian.

– Acho justo – disse Valérius, dando uma piscadela para Lita. – Para o mais merecedor, então.

– Vamos, Val – disse Riccardus interrompendo o flerte. –, está quase na hora.

– Precisamos ir, general – disse Valérius em despedida.

– Que Tauron lhes dê força.

– Cuide bem desse tesouro, até que alguém merecedor surja.

– Cuidarei.

Os dois se foram para a arena e, junto com eles, foi também a multidão. O som de uma trompa de guerra anunciou o início da cerimônia. Salustian não se preocupou em ficar para trás, pois já tinha um lugar reservado no camarote do Primeiro Cidadão.

Lita estava apreensiva com tudo o que acabara de ouvir. Sua mãe falava sobre seu futuro o tempo todo, e de como um dia ela seria parte do harém de algum minotauro nobre, mas seu pai nunca tocava no assunto. Desde o dia em que os dois haviam, finalmente, se conhecido que ele dizia apenas que tinha grandes planos para ela, mas nunca havia dito que planos eram esses. Desde então, Lita estudava e se preparava, hoje ela sabia que tinha mais conhecimento do que o escriba do pai. Conhecia também história e estratégias militares, além das artes. Ao longo dos anos ela começou a imaginar que estava sendo preparada para ser mais do que uma concubina, mas agora seu pai havia dito claramente que ela seria dada, como uma escrava qualquer. Seria dada ao futuro Princeps, mas ainda assim como uma concubina.

– Pai...

– Agora não, vamos assistir à cerimônia.

Os dois caminharam até o camarote, com os outros minotauros abrindo caminho para eles. No centro da arena os estudantes estavam reunidos em formação de batalha. Eles marcharam ao redor da arena saudando a plateia. Todos os pelotões paravam ao passar pelo camarote e saudavam o general. Após a apresentação, Salustian se pôs de pé para discursar para os formandos.

– Nobres cidadãos do grande reino de Tapista – disse Salustian –, eu tenho orgulho de lhes apresentar aqueles que serão os melhores guerreiros dessa geração. – Ele foi ovacionado por palmas. – Se os minotauros são a maior raça desse mundo, diante de vocês estão os melhores entre nós. Não só porque eles são excelentes soldados, mas porque eles são detentores de tudo o que nós aprendemos ao longo de séculos.

"Por que você me fez aprender tanto, por que me fez ter esperança?" Pensava lita. Ela sentou para sair de vista e baixou a cabeça para que seu cabelo cobrisse seus olhos, com medo de que alguém reparasse em suas lágrimas. "Tudo o que uma concubina precisa saber é como dar filhos".

– Como sabem, desde a criação de nosso poderoso reino, nós exploramos cada canto desse continente, e visitamos cada reino. Aprendemos tudo o que havia para ser aprendido, mas para quê? Todos sabemos a resposta. Ficamos calados a respeito dela durante muito tempo, mas finalmente chegou a hora. Nós estivemos nos preparando para a glória!

"Eu não quero ele. Não importa se ele é o futuro Princeps, eu não quero ele. Não importa se é isso o que o senhor planejou para mim, eu não quero ninguém".

– Porque nós somos o povo destinado a tomar as rédeas desse mundo, esse mundo de problemas, e guiá-lo para a paz de que ele tanto precisa. Mas sabemos que só existe uma forma verdadeira de paz: a paz através da força. E quem é mais bem qualificado para trazer essa paz ao mundo, se não os mais fortes de todos?

"O que você pensa que eu sou? Um objeto que você pode fazer o que quiser? Um animal de carga que você pode negociar?"

– Esses povos inferiores, governaram esse mundo por tempo demais e só souberam trazer desgraça para ele. No Norte chovem demônios, no Sul, orcs e hobgoblins avançam querendo nosso sangue. No reino capital, nossos "governantes" estão ocupados demais em intrigas políticas para notar o perigo que corremos. Não fazemos isso por nós, fazemos por eles, pois a única maneira de impedir que eles se deixem destruir é abrigá-los sob nossa proteção. Foi isso o que nosso deus nos ensinou. Somos os mais fortes por um motivo, para proteger os fracos.

"Eu te amo mais que tudo, por que fez isso comigo?"

– E o papel que cabe aos fracos é aceitar a submissão.

"Eu sou sua filha".

– Diante de vocês estão seus filhos. Aqueles que foram escolhidos por Tauron para ser a geração que levarão nossa raça a glória que tanto esperávamos. Sejam fortes, meus filhos, pois esperamos muito de vocês.

"Qual a diferença entre eles e eu?"

Salustian foi saudado entusiasticamente por todos os presentes, menos Lita, mas ninguém percebeu. Ninguém reparava na garota escrava. Depois que as palmas acabaram, os alunos se preparam para a última parte da cerimônia, os duelos. Não importava quem ganhasse ou perdesse, mas só aqueles que lutassem bem é que poderiam ser verdadeiros legionários. Valérius e Riccardus iriam lutar um contra o outro e os dois pareciam muito animados quando entraram na arena com armas nas mãos. Eles saudaram o general, e Valérius fez uma segunda saudação, um leve meneio de cabeça com um sorriso em direção a Lita.

– Pai – disse a jovem –, foi por isso que você me trouxe aqui, queria que ele me visse?

– Sim.

Riccardus avançou primeiro, com a lança baixa. Valérius se preparou para defender o golpe, mas Riccadus o driblou e golpeou com o escudo. Não foi um golpe forte, mas Valérius o bloqueou com facilidade. O irmão de Lita se afastou rindo.

– Era esse o seu grande plano para mim, me dar para ele?

– Se você se mostrar merecedora, sim.

Agora foi a vez de Valérius atacar. Ele não fez nenhuma brincadeira como Riccardus, saltou e estocou com a lança. Riccardus foi surpreendido pela violência do golpe e levantou o escudo protegendo a cabeça no último segundo. Agora foi a vez de Valérius se afastar dando risada. Riccardus tentou rir também, mas estava sem fôlego.

– E quando vai ser isso? – perguntou Lita.

– Daqui a dois anos ele será um adulto e um centurião, e você estará na idade certa para poder começar a lhe dar filhos. Você será meu presente de formatura para ele.

Valérius atacou com uma sequência de golpes de lança, alternando entre estocadas e varreduras, um deles tocou o chifre de Riccardus, fazendo voar uma lasca. Riccardus encontrou uma brecha entre a sequência de golpes para tentar um contra-ataque. Seu golpe arrancou uma das correias da armadura de Valérius, fazendo sua proteção de ombro cair.

– E o que devo fazer até lá?

– Sua escola tem cumprido bem o papel de lhe dar educação. Lá você aprendeu de tudo, menos como servir bem. Daqui para frente, você será a serva pessoal de Riccardus.

Lita observava seu irmão no meio do combate, imaginando o sofrimento que ele poderia lhe causar. "Não sou mais uma criança que você pode judiar à vontade". Por mais que seu pai negasse, Lita sabia como lutar, mesmo do alto, ela conseguia ver cada detalhe do combate que estava acontecendo abaixo, ela via os pontos fracos do irmão, e sabia que Valérius também os via.

Riccardus agora alternava golpes de lança e de escudo. Valérius aproveitou uma estocada mais longa e quebrou a lança de seu adversário usando a própria lança como alavanca. No golpe seguinte de Válerius, Riccardus desceu seu escudo como se fosse um machado, partindo também a arma do outro. Ambos sacaram espada.

– Mas pai, eu não gosto dele, nem ele de mim.

– No entanto, os dois farão a minha vontade.

Com o alcance curto das espadas, a luta ficou mais franca. Os escudos já não eram tão rápidos para bloquear todos os golpes e só não houve sangue por causa da qualidade das armaduras. Valérius foi empurrado ao chão. Riccardus achou que tinha a luta ganha, sua confiança foi tanta que ele não percebeu a armadilha. Valérius deu uma rasteira em Riccardus, esse caiu de mau jeito e torceu o braço por baixo do próprio escudo. Valérius encostou sua espada no pescoço do amigo e o juiz sinalizou para que a luta tivesse fim. O Primeiro Filho estendeu a mão para ajudar o amigo a se levantar. Os dois agora não eram mais meras crianças, agora eram irmãos legionários.

– Sirva-o bem – disse Salustian –, me prove seu valor, e quando o dia chegar, você poderá ser a mulher mais importante desse reino.

– Sim, senhor.

"Mas nuca serei livre".


Quem gostou, pode conferir o restante aqui: https://www.wattpad.com/story/61554576-rebeldes

Obrigado.

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Greerlan Nerlee
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Re: Conto Guerras Táuricas

Mensagem por Greerlan Nerlee » 23 Mar 2016, 20:08

Muito bom. Texto fluido, boas descrições de sentimentos e combate.
Parabéns, quero acompanhar o conto todo!

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Lucena
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Re: Conto Guerras Táuricas

Mensagem por Lucena » 23 Mar 2016, 21:04

Realmente muito bom! Já estou em Dario 4!
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Altemar Gavião
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Re: Conto Guerras Táuricas

Mensagem por Altemar Gavião » 23 Mar 2016, 22:48

Obrigado, pessoal. Estou aberto a críticas e sugestões. Todo feedback me ajuda muito.

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Altemar Gavião
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Re: Conto Guerras Táuricas

Mensagem por Altemar Gavião » 25 Jun 2016, 23:56

Pessoal, Eu inscrevi o conto no prêmio Wattys 2016. Qualquer curtida ou divulgação seria de muita ajuda. Valeu.

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Lucena
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Re: Conto Guerras Táuricas

Mensagem por Lucena » 26 Jun 2016, 00:10

Conte com a minha! Seu conto foi muito bom, um dos melhores situados em Arton que já li.
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