A casa se mostrava muito diferente de quando havia saído para treinar. Seu pai visivelmente enriquecera. Talvez fornecendo armas em grande quantidade. Tinha uma oficina de forja a nível de corporação na cidade.
O militar foi até a oficina. Retirou o ferrolho e vasculhou seu interior, sentindo o cheiro dos metais e a poeira dos anos. Mas algo naquela escuridão lhe chamou atenção. Era algo vermelho e de aspecto vítreo. De repente, alguém lhe surpreendeu:
― O que está fazendo?
Vérsico se virou. Era a sua mãe. Ele retirou o capuz aquietando o coração dela. Correu até a mulher e a ergueu com seus potentes braços. Ela sentiu-se comprimida e tentou evadir dos seus beijos, a barba por fazer do filho lhe roçava o pescoço. Quando se sentiu satisfeito, pousou a genitora no chão. Quando criança, media sua altura nos ombros da mulher, que com o passar dos anos pareceu ter diminuído enquanto ele só crescia. O tempo lhe foi rude, mas ainda assim conservou uma alegria ímpar.
― Se tivesse dado notícias de que viria eu teria preparado um guisado.
― Peço perdão mãe. Onde está o papai?
― Está lá dentro esperando o almoço. Vim aqui por intuição, desejei rever a oficina, seu pai nunca mais me deixa entrar aqui. Ou melhor, nunca deixa ninguém entrar aqui. Mas essa velha oficina me faz lembrar de você, de quando éramos mais humildes ― disse a mulher nostálgica.
― Parece que a senhora está muito bem para ter saudade daquela vida.
― E porque diz isso meu filho? ― perguntou a senhora.
― Para estar aqui jogando conversa fora, deve ter uma cozinheira esquentando a barriga no fogão lá dentro ― falou Vérsico.
― Ora! Não é porque é um sargento de Yuden que não posso dar-lhe uns tabefes ― disse ela ameaçando-lhe com a mão estendida. ― Entre, almoce conosco. Seu pai já deve estar à mesa.
O homem a acompanhou. A casa tinha empregados, algo que impressionou Vérsico. O Yudeniano foi até a mesa. Seu pai, sentado à cabeceira lançou lhe um olhar severo. O senhor gentil que andava sempre sujo de fuligem tinha cedido lugar a um homem de aspecto rijo e feições amarguradas. Parecia muito mais velho do que parecia. Em nada lembrava o seu pai. O cabelo arredio e castanho agora estava quebradiço, grisalho e com uma aparente calvície. As roupas puídas da oficina também não estavam mais lá, tecidos caros eram adornados com joias. Os dedos, todos anelados.
― Que surpresa um campeão de Yuden visitar a nossa humildade casa.
― Meu senhor, não fale assim do vosso filho ― disse a mulher, dispondo e servindo os pratos à mesa.
Vérsico sentou-se, distante, mas de frente para o seu pai.
― Pensei que isso estava resolvido no dia em que me deixou ir para a Academia Militar de Yuden ― disse o sargento rasgando o bife entre os dentes.
― Não se renega a família pela Nação ― disse o pai arrastando uma coxa de frango e a colocando no prato com agressividade.
― Mas com uma nação fraca não se pode proteger a família ― retrucou Vérsico.
― É costume dos soldados yudenianos pedirem a benção dos pais em nome de Keen para terem sucesso na guerra. Mas para alguns, o clamor das batalhas é mais importante que a benção de seus genitores ― triplicou o velho lançando um terrível olhar.
― Me parece que a guerra não lhe fez tão mal assim! Quem além dos nobres enriqueceu com a guerra mais do que as corporações de forja de armas? A guerra lhe trouxe indisposição para os negócios? Não é o que dizem em relação ao maior usurário de Kannilar.
O seu pai pensou em erguer a voz, mas sua esposa decidiu intervir. Caso contrário, entrariam em ferrenha discussão. Vérsico sabia que seu pai o tratava desse modo por estar magoado. A disciplina militar e o conforto da casa de seu primo eram um empecilho a uma visita. Embora nunca tivesse sido impedido, não se sentia mais pertencente aquele mundo de martelos e bigornas. Terminou de almoçar, despediu-se da sua mãe e do seu pai. Declinou do jantar, disse que estava em missão na cidade. Ele não cumprimentou o pai quando saiu, nem ele lhe abençoou ao sair.
Conjuração em Yuden - Parte 5
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