As Crônicas do Matador de Deuses
Enviado: 02 Fev 2014, 21:09
Quando se Perde Tudo
Primeiro - Deuses
Segundo - Aliança
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Quando se Perde Tudo
Uma. Duas. Três. A inchada descia com golpes firmes contra a terra. O rapaz passou as costas da mão na testa, onde o cabelo grudava por causa do suor. Respirou fundo. Seus braços tremiam, pois trabalhava desde cedo, mas nada do que não estivesse acostumado. Olhou em volta, a terra bem tratada e depois para o horizonte, com o sol se pondo. Havia sido um bom dia de trabalho, agora devia voltar.
Tinha o corpo esguio, magro e musculoso, os cabelos negros escorriam até perto dos ombros e eram meio presos. As roupas simples e surradas, de uma cor bege e marrom. Os olhos escarlates eram firmes e decididos, enquanto voltava para sua casa, naquele final de tarde.
Morava em casebre em meio às colinas, simples. A cozinha e dois quartos apenas. Analisou o ensopado e o pão em cima da mesa de madeira.
- Mãe! Cheguei! – anunciou.
Uma mulher alta e marcada pela idade surgiu. Cabelos castanhos e olhos da mesma cor, trajando um vestido azul desbotado apareceu, sorrindo.
- Que bom meu filho, sente-se e coma.
O rapaz não pensou duas vezes, deixou a inchada num canto e logo estava comendo. A mulher se colocou a sua frente sentada, o encarando.
- O que foi? – perguntou.
- Nos precisamos conversar.
- O que seria? – mordeu um pedaço de pão.
- Daqui sete dias você fará dezoito anos, acho que está na hora de procurar algo fora dos limites desta fazenda filho, você merece mais do que isso.
- O que? Ir embora? E a senhora?
- Ficarei bem, arrumarei um jeito de me manter.
- De jeito nenhum. E a fazenda? Não posso deixa-la sozinha.
- Darei um jeito, juro. Não quero que termine seus dias aqui, tem um futuro promissor, é talentoso, habilidoso... – deixou essa palavra no ar e o rapaz percebeu.
Ele se levantou bruscamente.
- Não acredito no que a senhora está propondo, não vou fazer, nunca.
Ela encheu o olho de lágrimas.
- Tem que parar de desperdiçar sua vida aqui.
- Chega, não quero ouvir – afastou-se em direção ao seu quarto – não se esqueça de que iremos cedo para a cidade amanhã.
Bateu a porta.
***
Levantou-se bem cedo, pouco antes do sol nascer. Sua mãe já havia preparado o desjejum e ambos comeram pão e leite em silêncio. Não muito depois, estavam sob o céu azul, em cima de uma carroça puxada por um pangaré.
- Filho?
- Sim? – respondeu sério, sem tirar os olhos da estrada, que se alongava entre colinas verdejantes.
- Sobre a conversa de ontem...
- Não quero saber mãe, não vou deixar à senhora, e pronto.
Ninguém mais falou durante o percurso. Depois de certo tempo o vilarejo de Aliric surgiu ao longe. Casas feitas de pedras colocadas e telhados de madeira, com muitas barracas do comércio, e foi para isso que haviam vindo até aqui. Deixou a carroça um pouco fora da cidade e amarrou o cavalo.
- Como sempre a senhora compra frutas e legumes, eu cuido do resto.
Desceu sério. Seu coração apertado, mas não podia ceder, não podia deixar a mãe sozinha como ela havia pedido. Talvez fosse uma provação dos deuses.
- Ax! – chamou alguém.
O rapaz virou-se depressa, e viu um rapaz ruivo e com sardas no rosto, vestido como um ferreiro. Camisa e calça simples e um grosso avental de couro. Entretanto magro, muito magro.
- Olá Albert, como está? – abriu um sorriso.
- Estou bem, pelo menos agora que consegui fugir daquela forja – suspirou – e você?
- Não sei exatamente, minha mãe agora enfiou na cabeça dela para eu partir, que não tenho futuro na fazenda.
- E ela está certa, você tem tudo para se der bem lá fora. É habilidoso...
- Por que todos falam isso? Sou apenas um fazendeiro.
- Não, você é mais que isso, eu me lembro daquele dia...
- Não mencione aquele dia Albert, nunca, foi sorte.
- Sorte? Não, não foi sorte.
- Acontece que não sei como fiz e não sei se posso fazer novamente. Simples assim.
- Sei, mas mesmo assim, acho que deveria tentar.
- E deixa-la sozinha?
- Ela é uma mulher forte Ax, ela lhe criou sozinha, quer maior prova que isso?
- Não consigo pensar em deixa-la Al, não posso.
O rapaz ruivo respirou fundo.
- Certo, faça como quiser, agora preciso voltar, meu pai deve estar doido atrás de mim.
Ax assentiu e viu o amigo virar as costas, depois de um tempo caminhou para dentro da cidade. Pessoas iam de lá para cá. Milicianos passavam atentos, com espadas nas cinturas e lanças em mãos, trajando pesadas cotas de malha. Como sempre fazia o rapaz dirigiu-se primeiro para a barraca de Louis, o grande homem de braba loira que vendia sementes, mas desta vez ele não estava lá, e sim sua filha. Uma moça altiva, com um vestido marrom e cabelos loiros e olhos verdes, a pele branca e delicada. Laura, a fraqueza de Ax.
- Bom dia Laura, onde está seu pai? – não sabia onde tirara coragem para falar.
- Está fora, estou cuidando de tudo hoje, só não poderei ajuda-lo a carregar os sacos – sorriu.
O rapaz ficou meio sem jeito.
- Ah, tudo bem, sem problemas.
- Então, o que vai querer?
- O que?
- As semente, quais serão?
- Oh, sim, vou querer...
- Seus olhos, são diferentes.
Ax desviou o olhar.
- Eu sei, é que...
- Não tudo bem, são bonitos, eu nunca tinha reparado.
- Oh, é que nunca conversamos.
- E mesmo assim sabe meu nome – soltou um risinho baixo.
Ax agora não sabia o que dizer. Ela reparou em seus olhos e ainda por cima falou que eram bonitos, e o pegou quando falou da questão do nome. Ele parou, refletiu e não teve tempo para resposta. Um grito veio do final da rua. Ambos olharam depressa.
- O que foi isso? – perguntou a garota.
- Não sei – parecia um homem com dor.
Tudo pareceu normal durante alguns instantes, às pessoas continuavam a comprar, então tudo mudou, os gritos ficaram mais altos e a correria se iniciou, o pânico se alastrou. Pessoas caiam e eram pisoteadas, barracas eram tombadas. Ax agiu instintivamente e estendeu a mão para a garota.
- Vamos, temos que sair daqui.
O pânico estava em seus olhos quando ela aceitou a ajuda e ambos saíram correndo. Ele a puxava por entre as pessoas, sem saber o que estava vindo. Olhou de soslaio para trás.
- Seu pai está fora da cidade, certo?
- Sim.
- Preciso achar minha mãe e poderemos fugir para a minha fazenda, estará em segurança lá até a milícia resolver o problema.
Ela assentiu e ambos continuaram a correr. Ele sabia que Laura só tinha o pai e uma vez que o homem estivesse fora, precisava só ir atrás da mãe agora. De repente, alguém surgiu em sua frente. Albert.
- O que está acontecendo? Não acho meu pai.
Ax respirava depressa.
- Não sei, algum tumulto eu acho, a milícia vai resolver logo, mas precisamos sair daqui.
Ele assentiu, e os três correram depressa, em direção à saída da cidade, porém as pessoas voltavam agora, pararam confusos, foi então que viram. Uma criatura alta com armadura cinza e olhos laranja, a pele branca e carcomida segurando uma espada em uma mão e uma mulher pelo pescoço em outra. A mãe de Ax.
O rapaz paralisou, seu coração disparou. As pernas fizeram menção de iniciar uma investida, mas antes que pudesse fazer algo os dedos se apertaram mais. A mulher olhou para o filho. Um olhar tranquilo e mesmo assim cheio de preocupação, antes de ter seu pescoço esmagado.
As lágrimas escorreram abundantes e quentes no rosto de Ax, chegando à boca, onde ele sentiu o gosto salgado. Seu corpo tremia, uma mistura de raiva, medo e remorso. Raiva daquele monstro. Medo de morrer também. E remorso por ter tratado a mãe mal e não poder pedir no mínimo desculpa antes dela morrer.
Seu corpo não se mexia. Só voltou a si, graças a Albert.
- Ax! Ax! Precisamos sair daqui, ou vamos morrer.
Mas era tarde, mais criaturas estavam chegando com facas e machado em mãos. Ax olhou em volta frio e ainda desolado.
- Não, por favor – chorava Laura.
- Estamos cercados – anunciou Albert – Ax, você podia lembrar como fez aquilo.
Viu o corpo de um miliciano perto, caminhou para perto, com os inimigos muito próximos. Pegou a espada do morto e atacou. A lâmina adentrou no ombro do primeiro. Levantou a perna esquerda, para evitar o corte de um machado, depois roubou a faca do que havia ferido no ombro e estocou a garganta do seguinte. Pegou o machado desse que agora caia e partiu a cabeça do terceiro.
- Ax! – chamou Laura chorando.
O rapaz virou-se depressa saindo do transe da batalha. Ela estava de joelhos, enquanto o mesmo monstro que havia matado sua mãe havia separado Albert em dois com as mãos! Pernas de um lado e o tronco do outro, as tripas no chão, sob o sol. Só então percebeu que não podia fazer aquilo, no que estava pensando. Correu até a garota e a puxou pela mão, e os dois correram para longe na direção oposta. O caminho estava repleto de cadáveres, inimigos espreitavam por todos os lados, e eles apenas corriam, e aparentemente eram os únicos sobreviventes.
Ax a puxava depressa, quase na outra saída. Seu peito ardia, a respiração ficava difícil, o corpo suava e dizia que não podia ir muito mais longe. Embora fosse jovem e vigoroso aquilo era demais, sem contar que tinha que puxar Laura e... O peso da garota sumiu, mas ainda sentiu que segurava sua mão, parou e olhou para trás. Ela estava dez passos atrasada, e ele ainda segurava algo. Analisou e viu um antebraço decepado.
- Não, não...
Laura chorava logo atrás com criaturas a cercando, Ax correu até ela. Agarrou o primeiro e o jogou no chão. Outro o mordeu e ele sentiu seu corpo fraquejar, de repente não tinha mais controle, a vista ficava embaçada e os músculos ardiam. Lentamente foi tombando e as criaturas, o cobrindo. Foi ficando difícil respirar. A agonia tomou conta de um corpo imóvel. Foi então que a luz voltou e um vulto passou. Ele escutou o som de aço e coisas caindo. Estava tudo escuro, quando sentiu alguém se aproximar.
- Garoto, você é louco.
Primeiro - Deuses
Segundo - Aliança
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Quando se Perde Tudo
Uma. Duas. Três. A inchada descia com golpes firmes contra a terra. O rapaz passou as costas da mão na testa, onde o cabelo grudava por causa do suor. Respirou fundo. Seus braços tremiam, pois trabalhava desde cedo, mas nada do que não estivesse acostumado. Olhou em volta, a terra bem tratada e depois para o horizonte, com o sol se pondo. Havia sido um bom dia de trabalho, agora devia voltar.
Tinha o corpo esguio, magro e musculoso, os cabelos negros escorriam até perto dos ombros e eram meio presos. As roupas simples e surradas, de uma cor bege e marrom. Os olhos escarlates eram firmes e decididos, enquanto voltava para sua casa, naquele final de tarde.
Morava em casebre em meio às colinas, simples. A cozinha e dois quartos apenas. Analisou o ensopado e o pão em cima da mesa de madeira.
- Mãe! Cheguei! – anunciou.
Uma mulher alta e marcada pela idade surgiu. Cabelos castanhos e olhos da mesma cor, trajando um vestido azul desbotado apareceu, sorrindo.
- Que bom meu filho, sente-se e coma.
O rapaz não pensou duas vezes, deixou a inchada num canto e logo estava comendo. A mulher se colocou a sua frente sentada, o encarando.
- O que foi? – perguntou.
- Nos precisamos conversar.
- O que seria? – mordeu um pedaço de pão.
- Daqui sete dias você fará dezoito anos, acho que está na hora de procurar algo fora dos limites desta fazenda filho, você merece mais do que isso.
- O que? Ir embora? E a senhora?
- Ficarei bem, arrumarei um jeito de me manter.
- De jeito nenhum. E a fazenda? Não posso deixa-la sozinha.
- Darei um jeito, juro. Não quero que termine seus dias aqui, tem um futuro promissor, é talentoso, habilidoso... – deixou essa palavra no ar e o rapaz percebeu.
Ele se levantou bruscamente.
- Não acredito no que a senhora está propondo, não vou fazer, nunca.
Ela encheu o olho de lágrimas.
- Tem que parar de desperdiçar sua vida aqui.
- Chega, não quero ouvir – afastou-se em direção ao seu quarto – não se esqueça de que iremos cedo para a cidade amanhã.
Bateu a porta.
***
Levantou-se bem cedo, pouco antes do sol nascer. Sua mãe já havia preparado o desjejum e ambos comeram pão e leite em silêncio. Não muito depois, estavam sob o céu azul, em cima de uma carroça puxada por um pangaré.
- Filho?
- Sim? – respondeu sério, sem tirar os olhos da estrada, que se alongava entre colinas verdejantes.
- Sobre a conversa de ontem...
- Não quero saber mãe, não vou deixar à senhora, e pronto.
Ninguém mais falou durante o percurso. Depois de certo tempo o vilarejo de Aliric surgiu ao longe. Casas feitas de pedras colocadas e telhados de madeira, com muitas barracas do comércio, e foi para isso que haviam vindo até aqui. Deixou a carroça um pouco fora da cidade e amarrou o cavalo.
- Como sempre a senhora compra frutas e legumes, eu cuido do resto.
Desceu sério. Seu coração apertado, mas não podia ceder, não podia deixar a mãe sozinha como ela havia pedido. Talvez fosse uma provação dos deuses.
- Ax! – chamou alguém.
O rapaz virou-se depressa, e viu um rapaz ruivo e com sardas no rosto, vestido como um ferreiro. Camisa e calça simples e um grosso avental de couro. Entretanto magro, muito magro.
- Olá Albert, como está? – abriu um sorriso.
- Estou bem, pelo menos agora que consegui fugir daquela forja – suspirou – e você?
- Não sei exatamente, minha mãe agora enfiou na cabeça dela para eu partir, que não tenho futuro na fazenda.
- E ela está certa, você tem tudo para se der bem lá fora. É habilidoso...
- Por que todos falam isso? Sou apenas um fazendeiro.
- Não, você é mais que isso, eu me lembro daquele dia...
- Não mencione aquele dia Albert, nunca, foi sorte.
- Sorte? Não, não foi sorte.
- Acontece que não sei como fiz e não sei se posso fazer novamente. Simples assim.
- Sei, mas mesmo assim, acho que deveria tentar.
- E deixa-la sozinha?
- Ela é uma mulher forte Ax, ela lhe criou sozinha, quer maior prova que isso?
- Não consigo pensar em deixa-la Al, não posso.
O rapaz ruivo respirou fundo.
- Certo, faça como quiser, agora preciso voltar, meu pai deve estar doido atrás de mim.
Ax assentiu e viu o amigo virar as costas, depois de um tempo caminhou para dentro da cidade. Pessoas iam de lá para cá. Milicianos passavam atentos, com espadas nas cinturas e lanças em mãos, trajando pesadas cotas de malha. Como sempre fazia o rapaz dirigiu-se primeiro para a barraca de Louis, o grande homem de braba loira que vendia sementes, mas desta vez ele não estava lá, e sim sua filha. Uma moça altiva, com um vestido marrom e cabelos loiros e olhos verdes, a pele branca e delicada. Laura, a fraqueza de Ax.
- Bom dia Laura, onde está seu pai? – não sabia onde tirara coragem para falar.
- Está fora, estou cuidando de tudo hoje, só não poderei ajuda-lo a carregar os sacos – sorriu.
O rapaz ficou meio sem jeito.
- Ah, tudo bem, sem problemas.
- Então, o que vai querer?
- O que?
- As semente, quais serão?
- Oh, sim, vou querer...
- Seus olhos, são diferentes.
Ax desviou o olhar.
- Eu sei, é que...
- Não tudo bem, são bonitos, eu nunca tinha reparado.
- Oh, é que nunca conversamos.
- E mesmo assim sabe meu nome – soltou um risinho baixo.
Ax agora não sabia o que dizer. Ela reparou em seus olhos e ainda por cima falou que eram bonitos, e o pegou quando falou da questão do nome. Ele parou, refletiu e não teve tempo para resposta. Um grito veio do final da rua. Ambos olharam depressa.
- O que foi isso? – perguntou a garota.
- Não sei – parecia um homem com dor.
Tudo pareceu normal durante alguns instantes, às pessoas continuavam a comprar, então tudo mudou, os gritos ficaram mais altos e a correria se iniciou, o pânico se alastrou. Pessoas caiam e eram pisoteadas, barracas eram tombadas. Ax agiu instintivamente e estendeu a mão para a garota.
- Vamos, temos que sair daqui.
O pânico estava em seus olhos quando ela aceitou a ajuda e ambos saíram correndo. Ele a puxava por entre as pessoas, sem saber o que estava vindo. Olhou de soslaio para trás.
- Seu pai está fora da cidade, certo?
- Sim.
- Preciso achar minha mãe e poderemos fugir para a minha fazenda, estará em segurança lá até a milícia resolver o problema.
Ela assentiu e ambos continuaram a correr. Ele sabia que Laura só tinha o pai e uma vez que o homem estivesse fora, precisava só ir atrás da mãe agora. De repente, alguém surgiu em sua frente. Albert.
- O que está acontecendo? Não acho meu pai.
Ax respirava depressa.
- Não sei, algum tumulto eu acho, a milícia vai resolver logo, mas precisamos sair daqui.
Ele assentiu, e os três correram depressa, em direção à saída da cidade, porém as pessoas voltavam agora, pararam confusos, foi então que viram. Uma criatura alta com armadura cinza e olhos laranja, a pele branca e carcomida segurando uma espada em uma mão e uma mulher pelo pescoço em outra. A mãe de Ax.
O rapaz paralisou, seu coração disparou. As pernas fizeram menção de iniciar uma investida, mas antes que pudesse fazer algo os dedos se apertaram mais. A mulher olhou para o filho. Um olhar tranquilo e mesmo assim cheio de preocupação, antes de ter seu pescoço esmagado.
As lágrimas escorreram abundantes e quentes no rosto de Ax, chegando à boca, onde ele sentiu o gosto salgado. Seu corpo tremia, uma mistura de raiva, medo e remorso. Raiva daquele monstro. Medo de morrer também. E remorso por ter tratado a mãe mal e não poder pedir no mínimo desculpa antes dela morrer.
Seu corpo não se mexia. Só voltou a si, graças a Albert.
- Ax! Ax! Precisamos sair daqui, ou vamos morrer.
Mas era tarde, mais criaturas estavam chegando com facas e machado em mãos. Ax olhou em volta frio e ainda desolado.
- Não, por favor – chorava Laura.
- Estamos cercados – anunciou Albert – Ax, você podia lembrar como fez aquilo.
Viu o corpo de um miliciano perto, caminhou para perto, com os inimigos muito próximos. Pegou a espada do morto e atacou. A lâmina adentrou no ombro do primeiro. Levantou a perna esquerda, para evitar o corte de um machado, depois roubou a faca do que havia ferido no ombro e estocou a garganta do seguinte. Pegou o machado desse que agora caia e partiu a cabeça do terceiro.
- Ax! – chamou Laura chorando.
O rapaz virou-se depressa saindo do transe da batalha. Ela estava de joelhos, enquanto o mesmo monstro que havia matado sua mãe havia separado Albert em dois com as mãos! Pernas de um lado e o tronco do outro, as tripas no chão, sob o sol. Só então percebeu que não podia fazer aquilo, no que estava pensando. Correu até a garota e a puxou pela mão, e os dois correram para longe na direção oposta. O caminho estava repleto de cadáveres, inimigos espreitavam por todos os lados, e eles apenas corriam, e aparentemente eram os únicos sobreviventes.
Ax a puxava depressa, quase na outra saída. Seu peito ardia, a respiração ficava difícil, o corpo suava e dizia que não podia ir muito mais longe. Embora fosse jovem e vigoroso aquilo era demais, sem contar que tinha que puxar Laura e... O peso da garota sumiu, mas ainda sentiu que segurava sua mão, parou e olhou para trás. Ela estava dez passos atrasada, e ele ainda segurava algo. Analisou e viu um antebraço decepado.
- Não, não...
Laura chorava logo atrás com criaturas a cercando, Ax correu até ela. Agarrou o primeiro e o jogou no chão. Outro o mordeu e ele sentiu seu corpo fraquejar, de repente não tinha mais controle, a vista ficava embaçada e os músculos ardiam. Lentamente foi tombando e as criaturas, o cobrindo. Foi ficando difícil respirar. A agonia tomou conta de um corpo imóvel. Foi então que a luz voltou e um vulto passou. Ele escutou o som de aço e coisas caindo. Estava tudo escuro, quando sentiu alguém se aproximar.
- Garoto, você é louco.