Diário de Aldred C. Maedoc III

Espaço para mostrar o material criado por você, de contos a desenhos. Leia e comente sobre as criações dos colegas do fórum!
Avatar do usuário
Aldenor
Mensagens: 17601
Registrado em: 09 Dez 2013, 18:13
Localização: Curitiba, PR

Re: Diário de Aldred C. Maedoc III

Mensagem por Aldenor » 15 Abr 2014, 00:24

Kalag 21, Weez, 1410 CE.
Imagem
A visão da estátua de Valkaria encheu meus olhos de lágrimas. Naqueles dias de aventuras, caminhadas por florestas densas, bosques, masmorras, montanhas, rios, mares, eu achava que nunca mais veria Valkaria. Mesmo que o grupo todo tivesse se inclinado a visitar a maior cidade do mundo conhecido para tentar resolver o problema da corrupção de Elinia, eu não acreditava que conseguiríamos. Sempre achei que fosse morrer e ser largado para lá. Afinal, eu não tinha os favores dos deuses e tão pouco tinha tanta fé na missão como Elinia e Drake.

Nunca fui afetado por esse sentimento de saudade. Em meus relacionamentos na adolescência, com meus pais, perante a cidade. Claro, sempre vivi em Valkaria e tinha ao meu alcance todas as coisas e todas as pessoas que mais me importavam. Mesmo viajando em Sckharshantallas e, depois, em Lamnor, não sentia as dores da saudade. Acho que comecei a pensar na minha cidade e na minha antiga vida despreocupada quando a possibilidade do grupo seguir o caminho dela se tornou real. Se sentir saudade não era uma das minhas características, o mesmo não podia dizer da ansiedade. Eu era super ansioso, de não conseguir ficar parado por muito tempo (desde que não estivesse morto ou muito ferido, claro). Meu estilo de luta se baseia em movimento. Mesmo sentado em enfadonhas mesas de almoços de valag em família eu não conseguia manter minhas pernas quietas.

Voltando um pouco.

Estávamos em uma ruína de uma antiga escola de magia em Wynlla, o Reino da Magia, governado por um conselho de magos, onde a arte arcana era banal e comum. Foi lá também que adquiri meu cinto de força, um item mágico bastante útil que servia para – sem surpresas – aumentar minha força. Eu me sentia tão forte quanto o gigante do grupo, o orc Gulsh. De qualquer maneira, fomos resolver uma missão para uma maga em troca da ajuda que ela nos deu para sairmos da porcaria de uma prisão, onde fomos colocados aleatoriamente por um capricho aventuresco de Valkaria, a deusa, não a cidade.

Para nossa surpresa, as tais ruínas da escola de magia fora corrompida pela Tormenta, os malditos lefeus. Por isso, enfrentamos mortos-vivos que cuspiam vermes lefeu para nos contaminar. E depois enfrentamos o que parecia ser um golem – criatura artificial criada por magos – embutido de matéria vermelha. Lefeu. Tudo lefeu. Era impossível derrotá-lo, então fugimos e adentramos mais afundo nas ruínas da escola até encontramos algo diferente. Queríamos desesperadamente encontrar a tal gema que a maga benfeitora nos pediu para levar a ela. E acabamos encontrando algo pior. Muito pior.

Eram monstros pequenos, magros e muito feios. De relance, quase pareciam crianças horrivelmente deformadas e subnutridas, mas um olhar direto nos revelou seu couro amarelado, quatro olhinhos inquietos, o buraco no lugar do nariz e a boca imensa, cheia de dentes grossos e afiados. Protuberâncias ósseas brotavam em lugares desencontrados, e as criaturinhas cobriam-se apenas de aventais de couro. Seu comportamento era frenético e enervante. Gargalhavam o tempo todo, saltavam e davam piruetas, machucavam a si mesmos ou uns aos outros quando ficavam nervosos ou empolgados.

Eles queriam negociar. Não conseguia entender o que eles eram, mas pareciam mesmo demônios. Do tipo das canções e histórias, aqueles que prometem vantagens em troca de sua alma. Certamente, criaturas malignas. Drake nem precisava nos dizer isso. Eles ofereceram a gema que procurávamos. Ou qualquer outra coisa em troca de conceitos. Alegria, paz, futuro, essas coisas abstratas.

Como é natural do nosso grupo, eu senti que alguém ia fazer alguma bobagem. Só que dessa vez, a bobagem poderia ser pior que a morte. Dessa vez foi Blasco quem tomou a frente e disse que trocaria suas memórias pela gema. A troca foi aceita antes que pudéssemos interromper. Se pudesse, eu teria cortado a cabeça de cada um daqueles demoniozinhos, mas me resignei a gritar um longo “não”.

Desmemoriado, duvido que Blasco soubesse que era um halfling. Alguns poderiam dizer que houve um lado positivo, pois também saímos com um incrível Rubi da Virtude, finalmente. O sacrifício desses dias de viagem em busca de pistas erradas com três mortes, dois desaparecimentos misteriosos e uma possível expulsão de uma Ordem foram apenas enterrados com a perda da memória de nosso companheiro. Pra mim, nada do que fizemos fez sentido na medida em que Blasco perdeu suas memórias. Mas saímos com um Rubi. O primeiro. Faltavam dezenove. Ou vinte. Desnecessário pontuar meus pensamentos. “Não valeu a pena”. Não importava o que os deuses bondosos diziam. Não era isso que eu considerava uma vitória.

Voltamos à capital de Wynlla, Sophand, onde entregamos a maldita gema para a maldita maga. Acabamos forçando ganhar mais informações, afinal, nós havíamos praticamente perdido um amigo. Eu havia perdido um amigo. E eu culpava o grupo. Aquele bando de lobos solitários, baratas tontas atrás de Rubis da Virtude havia roubado uma das poucas coisas positivas que eu considerava naqueles dias.

Enfim, depois de um ritual feito pela guilda que nos contratou através dessa maldita maga, descobrimos que Patrick estava bem e em um palácio. Provavelmente em Pondsmânia, o Reino das Fadas. Ele era uma fada e se estava em um palácio e não em uma masmorra aprisionado, acreditamos que ele estava bem. Teve um destino muito melhor que o nosso.

Ainda através do ritual bizarro em que víamos as imagens através de um círculo mágico, descobrimos que Harel (lembram dele?) estava sozinho, perdido, andando por aí em uma estrada desconhecida. Parecia também não se importar onde estava, com quem estava ou por que estava. Então, nós também não nos importamos muito com ele.

As informações mais úteis acabaram sendo sobre Castiel. O desmemoriado elfo (juro que eu esquecia esse detalhe com frequência) teve uma amostra de seu secular passado. Ele nasceu no ano 1.100 em Lamnor, filho da casa da Folha Voadora. E seu nome verdadeiro era Lanbaelsolaithque e ele teve um treinamento bárdico na guilda Quisather, a guilda da canção celeste. Ele também teve treinamento militar onde participou ativamente na Infinita Guerra (aquela que durou quase 400 anos e terminou com a derrota dos elfos frente a Aliança Negra). Aparentemente, Castiel, ou melhor, Lanbaelsolaithque, treinou por dez anos para sua ordenação e virar cavaleiro. E aí cessaram as imagens das lembranças dele. Por fim, ele viu o rosto de Glorienn. Havia, obviamente, mais mistério escondido aí.

“E quanto a Nathaniel?”, poder-se-ia perguntar.

O nosso velho mago e clérigo da deusa da magia foi expulso de forma bastante humilhante (imagino) e banido em vergonha para sempre de Sophand. Esse aí não vende nem tinta de pergaminho nunca mais. Seu nome está sujo e manchado para sempre na comunidade dos magos. Mas, pelo que entendi nada tem a ver com a religião, pois ele mantém o favor de Wynna. E, pelo que vi de sua cara, ele parece ter se agarrado a isso. Afinal, foi tudo que restou. Nathaniel perdeu até suas posses, como casa, sem nada.

Soubemos disso tudo ao vê-lo no portal oeste de Sophand (sim, íamos embora sem ele, naturalmente). Ele estava um pouco cabisbaixo e nos contou sua sina.

Foi assim que partimos de Sophand para Valkaria, continuar nosso caminho. A ideia principal era procurar Reynard (sempre considerei uma ideia pra lá de absurda, afinal, ele é um mago estudioso bastante ocupado) para tentar “curar” Elinia de sua corruptela. Foi assim que comecei a sorrir mais, foi assim que comecei a sentir, de fato, saudades de minha cidade, da minha terra e de meus pais.
Imagem Imagem Imagem Imagem Imagem Imagem Imagem Imagem Imagem
Imagem Imagem

Avatar do usuário
Aldenor
Mensagens: 17601
Registrado em: 09 Dez 2013, 18:13
Localização: Curitiba, PR

Re: Diário de Aldred C. Maedoc III

Mensagem por Aldenor » 17 Abr 2014, 21:27

Aztag 23, Weez, 1410 CE.
Imagem
A noite engolia o dia no final de uma velha trilha muito pouco usada nos tempos recentes no reino de Wynlla. Àquela altura, meu coração estava inquieto pelo que estava por vir. O medo e o receio se fortaleciam com minha ansiedade. Cães enormes surgiram mesclados à escuridão, com silhuetas sinistras. Segurei firme minha katana me preparando para o combate. Respirei fundo, primeiro ensinamento de um bom combatente, para tentar controlar a ansiedade e tornar o medo em uma ferramenta de sobrevivência.

Antes.

Éramos uma comitiva em viagem. Uma charrete e uma carruagem. Nathaniel estava em sua carruagem com dois cavalos e tudo o que lhe restou materialmente falando de sua vida em Sophand. Fiquei sabendo também que ele perdera seu item de poder (que eu não me recordo o que era) e, por isso, havia alguma dificuldade de manipular as artes arcanas. O que era curioso, pois foi o momento que achei oportuno para revelar mais capacidades arcanas que eu havia desenvolvido. No começo, Nathaniel demonstrou bastante curiosidade, me fez perguntas sobre feitiçarias que eu não sabia ao certo responder. Meu conhecimento mágico aumentou um pouco, e eu tinha as bases iniciais que me permitiam avançar em um estudo acadêmico. Por fim, revelei que sabia conjurar duas mágicas de proteção muito boas. Uma armadura e um escudo arcano, translúcidos e eficientes. Combinados aos meus movimentos estonteantes (sem medo de exagerar em meus feitos, como um bardo faria, eu realmente era um relâmpago no campo de batalha), eu me tornei um alvo muito difícil de ser atingido. E isso foi um alívio depois de tantas semanas levando bordoada e morrendo inclusive uma vez. “Maldito capitão hobgoblin”, eu pensava. “Agora tu não pode me acertar mais”, eu também gostava de pensar.

Contamos à Nathaniel sobre nossa missão para a Guilda da Sétima Estrela de Wynna (lembrei-me do nome, finalmente) e ele ficou intrigado. Apontou algumas incoerências. No fim, chegamos à conclusão que fomos enganados. Para variar. Éramos um grupo estrangeiro e era natural não sabermos nada do reino. Por isso, a guilda, aparentemente, nos contratou para nos levar a um lugar que NÃO ERA o maldito internato de magia que hoje em dia são ruínas. Afinal, parecia que a Guilda da Sétima Estrela de Wynna queria que enfrentássemos aqueles seres aberrantes da Tormenta e pegássemos a gema com os desgraçados demônios. Levantamos várias hipóteses, pois o demônio daria a gema em troca da ruína de alguém. No caso foi Blasco, mas poderia ser qualquer um de nós. Há indícios, então, de que queriam nos enfraquecer enquanto grupo (como se precisássemos de inimigos para isso!). À aquela altura a gente já aceitava que nossa missão sagrada pelos Rubis da Virtude não era mais secreta. Era possível que alguma divindade estivesse movendo suas peças contra nós. Mas quem? Por quê? Enfim, Nathaniel fez o que um bom acadêmico deve fazer: levantar dúvidas e questões. Por fim, ele analisou o Rubi da Virtude através dos seus livros e até com uma mágica para consultar a própria Wynna. Por fim, ele teve uma resposta inconclusiva. Podia ser como podia não ser um Rubi da Virtude. Desnecessário comentar como isso abalou nossos ânimos. Pelo menos o meu. Cada vez mais eu perdia o interesse nessa contenda.

No dia seguinte, levantamos acampamento após um rápido desjejum. O que teve de relevante nesse momento tão rotineiro nesses últimos meses? Um diálogo. Depois de reclamar mais uma vez (eu sempre reclamei da comida de estrada, das intrépidas rações de viagem com suas carnes secas, frutas cítricas, gorad, pão e queijo. Eu sentia saudades do bacon e do ovo frito), Drake me interpelou com uma voz monótona.

- Você deveria repensar em sua vida de aventuras.

Algo como: “você deveria pensar se é isso mesmo que você quer”. Ou “você não sabia que seria assim?” É claro que eu sabia. Apesar de ter sido vislumbrado, enquanto adolescente, das histórias fantásticas de aventuras dos meus pais e de outros heróis, eu sempre tinha a figura do meu pai, sisuda, carrancuda, para me puxar à realidade. Enquanto minha mãe floreava as aventuras, mostrava os derradeiros finais felizes que tiveram juntos, meu pai mostrava os lados ruins, os aspectos pesados e mais sérios. Então, por mais que eu reclamasse do desjejum diário, de ter que ficar pelo menos duas horas acordado toda noite para fazer turno de vigia (e interrompendo meu sono que me deixaria suficientemente descansado para lutar melhor) e outros problemas e obstáculos desagradáveis (e deselegantes) da vida de aventureiro, apesar de tudo isso, eu gostava do que fazia. Ou pelo menos achava que gostava.

Entretanto, essa ponderação de Drake (que eu não respondi, é claro) me fez pensar diferente pela primeira vez desde que saí de Valkaria através do livro mágico. Talvez fosse a proximidade de casa, talvez fosse a saudade a mola motivadora dos meus pensamentos e emoções daquele momento. Eu pensei que talvez fosse a hora de chegar em casa, rever meus amigos, meus pais, minha irmã, meus primos, tios e as tantas mulheres da minha vida (senti saudades de cada uma delas, seja a elfa Julyana, seja a barda Marina, seja a protótipo de aventureiro Camille, seja a bibliotecária Lucy, seja a professora Isabel, seja aquela pistoleira misteriosa) e ficar. Sim, aposentar a katana e me tornar professor. Jamais seria um miliciano, pois minha opinião sobre soldados é deveras crítica (quem quer ser pau mandado e lutar de forma estoica e sem graça?). Provável que pudesse virar um professor da Universidade Imperial pelo dia e um vigilante pela noite. De qualquer forma, divaguei, fantasiei bastante quanto a isso.

No final do dia, encontramos um pequeno posto comercial que não chegava a ser uma aldeia. Era uma taverna com quartos e estábulo para viajantes passarem a noite. Passamos a noite ali, comemos e bebemos (eu não tinha clima, a ansiedade me consumia até para me divertir) e dormimos. Mas nesta noite foi uma das vezes que mais meu coração me doeu.

Tirando os meus pensamentos egoístas de ficar em Valkaria, pensei em Blasco. Desde que ele abdicou de suas memórias, Victor tem sido seu companheiro mais fiel que Layca à Elinia. Blasco parecia uma criança. Não, pior que isso. Ele se maravilhava com tudo, sentia medo de quase tudo também. Quando anoiteceu pela primeira vez depois do incidente, ele ficou extremamente aflito e emocionado. Dava pra ver seu único olhinho brilhando e suas pernas tremendo. Dava muita pena. Ele falava pouco, se comunicava pouco. Victor tentava falar com ele sobre tudo, contava sobre as vezes em que nós três, principalmente, nos divertimos. E qual foi minha postura? A mais imbecil possível. Aos vinte e quatro anos eu ainda era um garoto mimado e egoísta. Preferi me distanciar mais e mais de Blasco. Sequer troquei uma palavra com ele. Eu notava olhares reprovadores de Victor. Eu não tinha estômago para lidar com Blasco. Não que fosse um incômodo, longe disso. Era simplesmente difícil lidar com aquela perda. Para mim, Blasco estava morto. Aquele não era Blasco, era apenas seu corpo. E isso destruía minha alma. Toda vez que ele falava, eu me calava e olhava para o lado. Sempre saia de perto quando o assunto era sobre ele.

Partimos no dia seguinte, mas não sem antes tomar um bom desjejum. Comi ovos e bacon como há muitas semanas não fazia. Meu desjejum preferido naquele tempo. A cerveja que bebi para empurrar não era das piores também. Com estômago forrado, olhos cegos para Blasco e cabeça distante na estátua de Valkaria, partimos da taverna.

Antes de encontrarmos uma encruzilhada na estrada, Nathaniel nos contou uma história. Um sonho terrível. Minha memória me fez o favor de esquecer alguns detalhes perturbadores. O fato era: envolvia escuridão, criaturas das trevas. Aparentemente, no nosso caminho (sim, ele sonhou com todos nós), enfrentaríamos a escuridão. Porém, havia um sol que nos acompanhava, nos iluminava o caminho no meio da noite. Não tinha cara de sonho comum. Tinha toda pinta de ser um sonho profético. Missão divina, sonhos divinos, Nathaniel era um clérigo de Wynna. Então, achamos por bem considerar aquilo ao invés de ignorá-lo como se ele fosse um louco paranoico. A teoria mais aceita foi que, como cada um dos Rubis da Virtude é ligado a um deus, era provável que cada encontro com um deles tivesse uma “temática” relacionada ao deus específico. Nesse caso, poderia ser Azgher. Ou Tenebra. Ou qualquer coisa.

A encruzilhada. Sim, depois de nos contar sobre seu sonho agourento, a estrada se dividia em duas. Um caminho bastante usado e bem cuidado e outro quase nunca usado, com graminhas e ervas nascendo por toda parte. Elinia e Layca investigaram o terreno e descobriram que uma carroça pesada com carregamento pesado passou por ali não há muito tempo. Era um caminho estranho. Porém, a gente ignoraria se não fosse pelo que Nathaniel nos disse:

- Ali é o caminho que leva para a ruína do internato. O verdadeiro. Não pelo lado que vocês foram.

Engoli seco.

- E daí? Nada tem a ver conosco? – Eu disse rapidamente. Já estava temeroso.

- Tem tudo a ver. Temos que averiguar o lugar. – Drake disse como uma ordem. Detestei aquilo e levantei da carroça.

- Temos que ir para Valkaria.

- O objetivo não é chegar à Valkaria, é encontrar os rubis.

A discussão havia apenas começado. Eu tinha um repertório de réplicas e tréplicas. Poderia escrever um tratado sobre isso. E, por fim, eu poderia dar minha cartada final questionando a liderança de Drake. E, se nem isso desse certo, eu pularia fora da carroça e racharia com o grupo. Para sempre. Valkaria estava ali, era só seguir e eles não queriam. Meu desespero podia crescer exponencialmente. Bem como minha capacidade de fazer besteiras.

Mas Elinia e Layca partiram à frente ignorando todos nós. Dorks veio à minha mente no mesmo instante.

Porém, quando ela tentou se transformar em uma loba como Layca, algo bizarro aconteceu. Não era um lobo comum. Era uma mistura de pelos, pele, músculos à mostra. No seu dorso dava pra ver seus órgãos internos. E ela não parecia notar. O grupo todo ficou abalado. Gulsh sacou seu machado e ficou muito calado. Quando o orc gigante não solta seus comentários sádicos, piadinhas sem graça e fora de hora, quer dizer que está com medo. Blasco também ficou cheio de medo, escondendo-se atrás de Victor. Não sabíamos o que fazer e nem o que esperar de Elinia. Entretanto, ela voltou ao normal subitamente nos indagando o que havia acontecido. Depois de explicarmos, ela ficou cabisbaixa e contou sobre um sonho que teve também. Mas ligado aos lefeu, os malditos demônios da Tormenta. Para mim, aquilo era uma expressão viva, um aviso dos deuses de que precisávamos chegar à Valkaria o quanto antes para encontrarmos um especialista em Tormenta para cuidar daquela corrupção.

Eu preparava meu contra-argumento, mas um grito – mais um gemido – me interrompeu. Uma mulher se arrastava pela estrada velha, cheia de feridas nos braços e pernas, além de sujeira pelo corpo, com sangue seco colado no rosto. Quando ela nos viu, desfaleceu como que aliviada. Elinia e Drake trataram de curá-la.

Sua história era comovente. Uma simples camponesa capturada por homens malignos e servida como ALIMENTOS para cachorros. Ela não entendia o que acontecia, nem por que faziam isso. Ela lamentou a morte de seu pai e de seus irmãos. Eu rangi os dentes ouvindo seu relato terrível. Desnecessário dizer que o herói dentro de mim explodiu pelo meu peito.

- Você será vingada. Não se preocupe. Quem fez isso contigo pagará com a vida. – Eu disse cheio de ódio.

Ela vinha do caminho das ruínas do internado. Ou seja, Drake vencera aquela pequena disputa. Eu mesmo não queria ir mais para Valkaria antes de matar os crápulas. Enchi meu peito de coragem e estava preparado para tudo. Aparentemente era um acampamento de gente ruim, talvez mercenários capturando pessoas como escravas para vender em lugares igualmente malignos. Se havia algo que me tirava (e me tira ainda) do sério, é a supressão da liberdade alheia. Algo mais hediondo que a morte, para mim.

Escravidão é pior que a morte.

Então, nos preparamos para seguir o caminho do internato na velha estrada carcomida pelas ervas daninhas. Mas uma querela surgiu. O que fazer com a camponesa?

- Deixe a vagabunda aí e vamos logo. – Gulsh falou.

- Ela não é nenhuma vagabunda. – Eu disse. Gulsh me ignorou dando de ombros.

- Vamos levá-la conosco, pois não é uma boa ideia voltarmos para aquela taverna de estrada. – Drake sugeriu.

- É loucura a fazermos voltar para o lugar que lutou tanto para fugir. – Eu disse. – Mas sempre podemos perguntar a ela o que quer.

- Não, não quero voltar. – Ela disse com olhos esbugalhados e chorando em seguida. Ela provava meu ponto. Podia ter perdido a pequena disputa para onde íamos, mas aquela querela eu ia ganhar certamente.

- Você tem ideia melhor? – Drake perguntou.

- Sim. Um de nós, que não seja o Blasco, pode voltar com ela para a taverna. Não sei quem faria isso, pois todos nós somos necessários nessa contenda. – Respondi. A verdade era que eu não sabia muito bem o rumo a tomar.

- Eu a ajudarei. – Disse Nathaniel.

Em seguida, ele retirou seus pertences de sua carroça (eu o ajudei) e deu seus dois belos cavalos para levá-la de volta para a taverna. Ele deu uma moeda de ouro e eu dei um saquinho com uns quinze tibares de ouro dentro. Ela poderia voltar e recomeçar a vida de alguma forma. Era o mais humano a se fazer.

Voltamos para a estrada. Seguimos nosso caminho. Foi tão longo que o dia começou a ir embora. Porém, escureceu rápido demais. Havia, literalmente, uma área escura como a alta noite. Ali, Azgher não tinha vez. Nosso destino, uma verdadeira ruina do que poderia ter sido uma escola, um internato de fato, estava envolto a trovões e tempestades. O lugar era tenebroso e, obviamente, perigoso. Conjurei a Armadura Arcana (que tinha uma durabilidade maior que o escudo mágico) e me preparei. Ouvimos, subitamente, uivos. Saquei a katana rapidamente e me preparei, olhando para todos os lados.

Do chão, como se chamados pela própria deusa das trevas, cães malditos surgiram com rosnados e uivos sinistros. Tinha quase um metro de altura e sua pelagem era de um negro profundo como a noite sem lua.

Saltamos da carroça para o combate. Antes, entretanto, eu conjurei o Escudo Arcano. A combinação dos meus dotes físicos e mágicos me garantiu uma boa proteção. A luta não foi demorada. Quatro cães sombrios, lutamos bem. Layca, entretanto, sofreu bastante. Apanhou com veemência e quase morreu. Desse lado da carroça, eu e Elinia ficávamos em dois cães. Castiel tocava sua ocarina para nos inspirar. Dessa vez foi uma música agitada, um épico heroico. Realmente nos inspirava. Pelo menos a mim. Eu adorava lutar sob sua trilha sonora.

Do outro lado, Gulsh e Drake se ocupavam dos outros monstros. Blasco chegou a ser agarrado, coitado e quase foi devorado. Victor o ajudou e conseguiu libertá-lo. Depois, juntou-se a Gulsh e Drake. Nathaniel ficou sobre a carroça, o que era esperado, e conjurou seus mísseis mágicos. Eu fiquei cheio de vontade de conjurar também para medir qual era o mais poderoso, mas não tive oportunidade. Minha técnica com a katana era mais eficiente que minha magia, certamente.

Matamos alguns, mas no fim, eles fugiram. Porém, ouvimos uivos, assovios. Criaturas uivando, eu imaginei serem outros cães malditos. Mas assovios? Talvez fossem os homens escravagistas. Ou talvez fossem algo pior...
Imagem Imagem Imagem Imagem Imagem Imagem Imagem Imagem Imagem
Imagem Imagem

Avatar do usuário
Aldenor
Mensagens: 17601
Registrado em: 09 Dez 2013, 18:13
Localização: Curitiba, PR

Re: Diário de Aldred C. Maedoc III

Mensagem por Aldenor » 22 Abr 2014, 20:44

Aztag 24, Weez, 1410 CE.
Imagem
O tempo foi de respirar fundo e pronunciar minhas palavras mágicas novamente para invocar o Escudo Arcano (ao contrário da Armadura Arcana, o Escudo dura apenas um minuto ativa). Os uivos e os assovios ficavam cada vez mais altos. Meu coração batia forte. Estávamos divididos entre os lados da carroça. Eu, Elinia e Layca de um lado, Gulsh, Drake e Victor do outro. Blasco estava atrás de Victor também, pobre coitado. Não consigo nem conceber o medo que ele sentia.

Nathaniel estava também desse lado, atrás de Drake. Pelos meus cálculos, ele estava quase exaurido de magia. Porém, como um clérigo abençoado por Wynna e mago, ele tinha capacidade de manipular todos os tipos de energias mágicas, sejam elas arcanas ou divinas. Suspeitava que ele estivesse gastando suas forças divinas, enquanto resguardava para o final o poder bruto arcano, que todos sabem, é o mais poderoso.

Súbito, homens muito peludos vestindo peles esquisitas avançaram sobre nós, aparecendo no nosso campo de visão (graças à magia de luz conjurada por Castiel). Com um olhar mais atento, notei que eles não eram homens normais. Eram peludos, com pernas dobráveis para trás, orelhas enormes, focinho, dentes malignos e olhos vermelhos. Eram uns malditos lobisomens. Eles carregavam machados de batalha e espadas de lâmina grosseiramente larga. Todas de qualidades estupendas e frutos de óbvios saques de vítimas anteriores. Porém, o que mais me enojou (no sentido literal mesmo) era a “armadura” dos monstros. Feita de pele de gente. Dava para divisar joelhos, braços, dedos. E até um rosto colado nas costas de um, como se fosse uma macabra máscara. Esses monstros não podiam continuar existindo. Engoli seco e juntei minha confiança para a luta.

Logo Layca e Elinia foram derrubadas e eu fiquei sozinho encarando três lobisomens. Do outro lado eu pude ouvir que Gulsh partiu em carga, afastando-se da carroça. Um erro estratégico até bobo, mas eu confiava na capacidade de Gulsh no combate. Ele sabia o que fazia.

Ou era isso que eu achava até umas poucas horas seguintes.

Castiel e Nathaniel se alternavam em derramar suas curas sobre nossos aliados. Victor ficou enorme, com mais de três metros de altura, maior até que Gulsh. Seus socos retumbavam a cada golpe. Drake e Gulsh se engalfinharam com dois lobisomens e lutavam de maneira exemplar, pelo que me lembro.

Eu mesmo tive uma atuação satisfatória. Fui atingido uma única vez por um machado. Movia-me, desviava, aparava, defletia com meu corpo embutido de magia. Meus golpes também eram certeiros e poderosos, porém, algo na pele daquelas criaturas impedia que eu acertasse algum osso, me impediam um corte mais profundo. Quando estava achando que as coisas iam mal (afinal, eu estava sozinho contra três), um homem surgiu do nada.

Sempre desconfiei de pessoas que surgiam do nada. Obviamente elas poderiam tomar qualquer lado em um combate. Ele estava descamisado, era branco e tinha tatuagens intrincadas em metade do torso e em um braço. Tinha calças largas, comuns e carregava um machado (parecido com os dos nossos antagonistas bestiais). Mas o exótico nele era uma camisa rústica envolvendo seu rosto, deixando apenas seus olhos às vistas. Era um estranho elmo, aparentemente. Só que feito de pano simples. O que ele pretendia com aquilo eu não entendia, mas fiquei desconfiado, já me preparando para saltar sobre a carroça e tentar uma manobra evasiva.

Mas ele (felizmente) atacou um lobisomem. A essa altura, Layca e Elinia estavam de volta ao combate graças à cura de Castiel (ou Nathaniel, não recordo). As duas juntas eram uma dupla incrível. Loba e mulher. Brutalidade e magia. Então, elas, juntamente com Castiel que estava lutando com seu florete e sua magia que deslocava o ar tornando-o cortante, atraíram dois lobisomens. Eu e o mascarado desconhecido enfrentamos dois monstros. Eu me movia para os lados, desviando e atacando, aproveitando minha velocidade dentro do combate. O mascarado fez o que pôde para me acompanhar para aproveitar o flanco. Porém, acredito que aquelas bestas não se deixavam enganar tão facilmente. Ele acertou um golpe fortuito, mas não arranhou a pele endurecida. Mas ele me ajudou bastante.

Por fim, eles nos surpreenderam novamente. Aos poucos, cada um deles foi berrando em uníssono. Seus braços inflaram e seus olhos vermelhos injetaram de raiva. Babavam também, como se estivessem famintos. Era a fúria bárbara, uma capacidade que Gulsh também tinha (e também estava em tal estado naquele momento). A luta ficou mais difícil, mas pelo menos eles largaram suas armas e passaram a atacar com suas garras e mordidas cruéis. Castiel gritou para evitarmos sermos mordidos. Isso eu fazia muito bem, mas soube mais tarde que Victor havia sido atingido de forma crítica. O motivo para tamanha preocupação com a mordida? A maldição da licantropia. Sim, além de feras terríveis, fortes e cruéis, eles transmitiam essa capacidade, esse “dom de Tenebra” adiante. Quem fosse mordido por estas bestas, teriam a chance de se tornarem bestas iguais na próxima lua em escudo.

Derrotamos, com muito sacrifício, o bando de lobisomens. Drake trocou seu papel de combatente para curandeiro e começou a tratar dos ferimentos de Victor, Gulsh e os outros. Castiel também entoou milagres com sua ocarina e eu restabeleci meu pequeno ferimento. A despeito do horror que aqueles monstros trouxeram para nós, eu me senti bastante confiante e capaz. Apertei fundo o punho da katana e notei visíveis melhoras nas minhas técnicas. E a capacidade de conjurar magias arcanas era um sinal do meu desenvolvimento. Eu caminhava a passos largos para despertar os poderes dracônicos ancestrais da minha família.

Voltamos nossas atenções para o mascarado. Ele não se apresentou (ou eu não lembrei do nome na época), mas disse que era um clérigo de Azgher, por isso a camisa enrolada na cabeça. Era uma das obrigações do deus-sol (e ferrenho inimigo de Tenebra, a deusa das trevas), manter o rosto oculto de todos. As tatuagens eram khubarianas, mas ele mesmo não havia nascido lá, apenas criado por um pai khubariano. Khubar é uma ilhota a leste do Reinado povoada por um povo altivo e rústico, mas sofisticado em filosofia e religião. As tatuagens tinham grandes poderes, diziam e eram bastante tradicionais nos guerreiros. Entretanto, ele estava sem seus poderes divinos. Azgher o havia abandonado por ter tido sua máscara removida por seus captores. Ele nos explicou que ele e seu grupo de aventureiros foram capturados em Portsmouth e vendidos para esses bárbaros e servir de sacrifício à Tenebra. Ele não teve mais notícias de seu grupo. Entretanto, ele não estava apto para tal ritual. O que é estranho, uma vez que ele era um Aggelus. Sim, uma criatura com sangue de algum ser divino dos planos dos deuses. Filho de um anjo, talvez. Mas, de algum modo, toda aquela sacralidade sanguínea não era requerida por aquele culto de Tenebra. Sendo considerado inapto, ele se tornou comida de bruxa.

Ele foi levado do tal Internato abandonado para um pequeno acampamento, onde os lobisomens viviam para capturar vítimas, saqueá-las e dá-las como comida da bruxa. A tal mostrenga era um tipo de líder deles. Castiel me surpreendeu quando nos contou a história desse tipo de bruxa, somente pelos hábitos alimentares e por algumas descrições parcas do clérigo de Azgher.

Tratava-se de uma “bruxa do crepúsculo”, um ser desprezível, trapaceira sádica que devorava carne de gente. Segundo o clérigo de Azgher e do relato daquela jovem encontrada na estrada, havia outros prisioneiros vivos. O clérigo de Azgher disse que eram três crianças e dois adultos. Crianças. O sangue me ferveu e eu desejei matar aquele monstro com minhas próprias mãos. Esse desejo fez um ferimento em meu punho fechado. Ao olhar para mão, percebi que haviam garras afiadas nos dedos. Fiquei assustado de imediato e as garras sumiram.

Castiel conjurou sua mágica para tentar detectar se algum de nós havia sido amaldiçoado com a licantropia e percebemos, com tristeza, que Victor fora o escolhido. Pelo que entendi, nosso amigo poderia se transformar nesse tipo de besta e perder o controle, não divisando amigos de inimigos, atacando aleatoriamente com raiva. Mas esta era uma preocupação futura.

Sem mais delongas, partimos em direção ao tal acampamento. Drake emprestou uma cota de malha que estava em sua mochila para o clérigo e Elinia lhe fez uma espada longa (arma que ele mais sabia usar e sentia à vontade) de madeira. Mas muito afiada, nada devendo a uma arma de metal. Ainda segundo o clérigo de Azgher, matamos praticamente todos os lobisomens. Havia apenas um deles vivo, guardando o lugar. Não seria páreo para nós.

Depois de mais ou menos uma hora, chegamos lentamente e pudemos ver na penumbra uma cabana de alvenaria e teto de palha. Havia outras tendas espalhadas pela clareira. Estávamos um pouco distantes daquela floresta de árvores velhas e retorcidas. O céu eternamente escuro com aquela lua brilhante. Era como se pulássemos para dentro de uma canção fantástica, daquelas que nossas mães contam para nos assustar. E aquilo era terrivelmente assustador.

Perto da cabana principal, havia uma construção menor. O clérigo de Azgher apontou explicando que fugira dali. Sem muita vontade de nos fazer furtivos, lançamos magia de luz. Conjurei minha Armadura Arcana e, em seguida, meu Escudo. Então, o único lobisomem apareceu com dizeres estranhos.

- Eu tinha te deixado ir. E você voltou. – Era um misto de palavras entre rosnados.

- Não ia deixar esses inocentes para trás. – O clérigo respondeu.

Avançamos para o combate, nos posicionando. Aproximamo-nos com cautela, eu, Victor, Elinia, Layca, Gulsh e Drake (o paladino lefou instruiu mais uma vez ao nosso orc gigante para não se separar do grupo, para avançarmos em bloco). O lobisomem se afastou lentamente para perto da entrada da cabana. Enquanto isso, Castiel, Nathaniel e o clérigo de Azgher começaram a se dirigir onde os prisioneiros estavam. Dessa vez deixamos Blasco para trás, para cuidar da carroça. Era uma medida temerária, mas duvidamos que houvesse alguma outra ameaça além dos lobisomens e da bruxa no lugar e nós havíamos matado quase todos eles.

Então, começamos a lutar. Gulsh e Drake esmagaram o monstro. Victor colou nele e os três começaram a fazê-lo recuar. Eu olhei para Elinia e a vi com Layca observando os arredores. Claro, a bruxa ainda não havia aparecido. Por isso, desisti de atacar o bárbaro, por mais que me doesse sair de um bom combate.

Súbito, risadas. Engoli seco, senti um frio na espinha. Olhei para cima instintivamente, afinal, as bruxas das canções também voavam em vassouras mágicas. Mas esta não. Apareceu saindo da cabana, como uma velha comum. Corcunda, com um cajado de madeira grosso com a ponta retorcida em caracol. Ela tinha o rosto completamente distorcido por rugas de velhice. Parecia uma mulher velha comum. A estranheza da cena me fez duvidar do real perigo. Ledo engano. Um monstro que conseguisse dominar um bando de lobisomens e seus cães das sombras não poderia ser uma velha inofensiva.

Com duas cajadadas, ela quase derrubou nossa fortaleza, Victor. Por mais que Drake fosse o metal ambulante, Victor era quem conseguia aguentar a maior quantidade de castigos físicos dentre nós. E eu vi sua pele murchar, seu rosto encolher. O cajado não era normal, é óbvio. Retorcia a carne e matava aos poucos. Avancei com velocidade e errei meu primeiro golpe. Gulsh desistiu do lobisomem e avançou sobre a bruxa também. Elinia entrou no combate com Layca atacando e mordendo a velha. Restou Drake contra o lobisomem e, de repente, parecia que poderíamos vencer com até alguma facilidade.

O combate foi evoluindo e nós começamos a vencer, ainda que com algumas baixas (Gulsh e Victor caíram). Mas, por um erro de movimentação, ou por esperteza da bruxa, ela encurralou Elinia e a derrubou. Layca também já estava derrotada a essa altura, acredito que pelos golpes do cajado maligno. Um pouco mais afastado, o lobisomem solitário estava enfrentando o clérigo de Azgher praticamente sozinho. A bruxa estava sobre Elinia, mas nós a encurralamos.

- Vou matá-la. – Sua voz era esguichada e carregada de sadismo. – Recuem ou vou mata-la. - Com o cajado sobre Elinia, descendo lentamente.

- Não! NÃO! – Eu gritei embainhando a katana novamente. Drake afastou-se e aproveitou o momento para curar Gulsh, erguendo-o do chão. – Vamos embora! Vamos embora! Deixe-nos pegá-la e iremos embora! – Eu gritava.

- Vão embora. – Respondia ela com um risinho.

- Não podemos deixá-la aqui. Não vamos embora sem ela. – Era Drake com sua voz de marreta. A bruxa desceu mais ainda o cajado.

- VAMOS EMBORA! – Eu gritei. Mas parecia em vão. Elinia iria morrer.

Ouvimos uma canção. Uma canção que conhecíamos, fazia parte do repertório mágico de Castiel. Ele surgiu atrás de todos e a bruxa parou subitamente. Sua boca abriu-se lentamente e seus olhos ficaram vazios, encarando o nada. Castiel fascinara a bruxa!

Lembramos que qualquer movimento ofensivo quebraria o efeito. Então, todos nós movíamos cautelosamente perto dela, retirando Elinia e Layca dali de perto. Eu me virei para o clérigo de Azgher e o lobisomem que ele enfrentava e rangi os dentes de raiva. Avancei sobre ele e o matei com minha katana. Não podíamos ser ofensivos, mas contra a bruxa. Nada acontecia se matássemos o aliado dela. Começamos a ir embora. Eu nem cheguei a ver as pessoas inocentes na cabana, nem as crianças, nem os adultos prisioneiros. Aparentemente, enquanto lutávamos, Castiel e Nathaniel cuidavam deles ou os guiaram para fora.

Então, Gulsh aconteceu. Vi com horror um foco de incêndio no telhado de palha. Não demorou muito para as chamas lamberem totalmente o teto e brilharem como um farol no meio da escuridão. A bruxa piscou o olho. Estava de volta. E sorriu com seus dentes (ou falta de) podres malignamente. A batalha voltara.

Eu peguei o Elinia e Layca e deixei Gulsh, Castiel e Drake lutando contra ela. O clérigo de Azgher pegou Victor e fugimos com Nathaniel para a floresta. Corri como nunca, imaginando se eles estavam bem. Então, me ocorreu que não. Gulsh estava muito ferido. Castiel também e ele não é um guerreiro propriamente dito, apesar de lutar bem com seu florete. Apenas Drake estava bem e, mesmo assim, era somente um contra as habilidades malditas do monstro.

Deixei Elinia e Layca sob uma árvore e dei um olhar significativo para Nathaniel que vinha logo atrás. Voltei correndo e pude ver que o clérigo de Azgher não havia deixado o campo de batalha e estava preparando para lutar contra a bruxa. Era o que eu devia ter feito desde o início.

Aproximando-me cada vez mais, sob as luzes mágicas da área, eu vi Gulsh caído. Estava bem perto quando Drake desferiu uma poderosa marrada com seu martelo mágico, desfigurando o rosto da bruxa. Ela mantinha-se de pé, girando com velocidade seu cajado. Então, eu cheguei finalmente.

Gritei com raiva, desesperado. Minha katana cortou horizontalmente no torso e eu continuei o movimento, passando por ela. Por um momento eu achei ter visto seu corpo abrindo numa ferida enorme. Achei que ela fosse se partir pela metade. Mas com um olhar mais cuidadoso, eu vi que apenas rasguei seu manto grosso e sujo. Girei o corpo a tempo aparar o primeiro e o segundo golpe dela, rápidos e violentos. Dei um passo à frente para o corte ser mais longo. Desferi-o diagonalmente e abri sua clavícula até a altura do peito. O sangue grosso e escuro espirrou e manchou seu manto imediatamente. Ela tombou de lado rapidamente.

Passado o perigo, Drake não poupou vocabulário para repreender Gulsh. Eu só estava aliviado pelo fim da violência, então preferi me poupar de dar uma de paizão. Mas minha vontade, de fato, era de abandonar Gulsh em uma próxima taverna qualquer. Não só pela grande besteira que ele fez naquele dia, mas de outras anteriores e pelo jeito horrível de lidar com a vida e as pessoas. Sempre com comentários fora de hora, sarcásticos. Eu admito que naquela época eu também era dado a falar algumas besteiras, mas por arrogância vazia. Ele fala quase que por maldade, não se apieda dos mais fracos e dos necessitados. Ele não dá valor a nada e nem a ninguém, ou pelo menos, não parecia dar.

O clérigo de Azgher ainda falou que havia uma menina dentro da cabana. Ainda viva, mas sem os braços. Gulsh disse que ela não poderia estar viva. Pensando nisso, agora me recordo que o clérigo havia me dito a mesma coisa, para eu tentar salvá-la. Mas devido ao contexto, eu estava avançando na carga final contra a bruxa, acabei me concentrando totalmente no meu golpe e não pude dar a devida atenção às palavras do clérigo. Porém, Gulsh havia entrado anteriormente na cabana. Ele viu a menina. E ela estava viva, segundo o clérigo. E Gulsh tocou fogo na cabana mesmo assim. Não que ele quisesse queimá-la, ele não sabia dizer se ela estava viva. Porém, tão pouco sabia dizer se estava morta.

Enfim, foi uma atitude desastrosa.

O grupo vasculhou (eu não, pois nunca pilho, como o leitor atento já deve ter percebido) a cabana e acabou encontrando o que poderia ter sido valioso um dia. Agora era material derretido e inútil. Aparentemente, o equipamento do clérigo de Azgher estava ali, a meia-armadura, a espada de mitral. Tudo derretido e misturado com moedas, ouro e metal fundido. Quase nada era útil. Apesar da camisa enrolada na cabeça, era óbvia a expressão na cara do clérigo novato.

Retornamos até a carroça e decidimos que iríamos às ruínas do Internato, que servia de templo de Tenebra naquele momento. No meio do caminho nos deparamos com um pântano nojento, asqueroso. A carroça certamente iria afundar, mas não precisei falar disso. O grupo começou a andar para trás. Eu mesmo não emitia opiniões nesse momento. Apesar de estar bastante confiante para o combate, eu ainda carregava a imaturidade juvenil para decisões desse tipo. Havia muito em jogo ali e eu preferi observar o que os outros falavam. Se tivesse que escolher, sempre estava mais aberto aos argumentos e Castiel e Nathaniel. Eu tinha um preconceito com Drake pelo jeito dele, ainda que neste dia ele não tivesse tomado nenhuma decisão ruim, pelo contrário. Dentro do combate, ele deu as melhores ordens.

Então, Arevik (descobrimos finalmente seu nome) disse que queria ir de qualquer jeito. Mas acabamos persuadindo o novato. Retornamos daquele lugar terrível e voltamos para a estrada, onde decidimos dormir para descansar, curar nossos ferimentos e principalmente os de Elinia. Senti que era o melhor a se fazer, afinal, nosso destino não iria mudar nem sair correndo.

No dia seguinte, um desjejum com gosto amargo.

Arevik se ergueu decidido depois de suas orações. Avisou-nos que iria sozinho se fosse necessário para o Internato, pois sonhou com uma mensagem de Azgher conclamando a missão. Ele não podia esperar mais nenhum minuto. Eu o entendi, apesar de considerar lastimável como um devoto de um deus tem suas liberdades limitadas por sua fé. Aparentemente, segundo Arevik, Azgher lhe disse que a batalha no Internato era pra ter acontecido ontem. E ele não nos guiou como estava previsto no destino dele. Para mim, aquilo não fazia sentido, então, não dei mais bola para isso do que para meu gorad. Mas hoje tenho ciência da gravidade do problema. Azgher é um deus vigilante e bondoso, mas também severo. Arevik estava em falta com sua divindade. Partimos imediatamente, não pretendendo deixar que o clérigo se jogasse sozinho na escuridão de Tenebra.

Antes de partirmos, deixamos a carroça (que iria afundar no pântano mesmo) para Blasco e o instruímos a seguir até uma cidade mais próxima. Passados cinco dias e nós não retornássemos, que ele buscasse seu próprio destino. Enterramos nossos pertences bem como tesouros e pilhagem dos lobisomens (que não foram destruídas por Gulsh) próximos à estrada.

Partimos de volta ao pântano e às ruínas do Internato logo pela manhã.
Imagem Imagem Imagem Imagem Imagem Imagem Imagem Imagem Imagem
Imagem Imagem

Avatar do usuário
Aldenor
Mensagens: 17601
Registrado em: 09 Dez 2013, 18:13
Localização: Curitiba, PR

Re: Diário de Aldred C. Maedoc III

Mensagem por Aldenor » 23 Abr 2014, 17:48

Imagem

Como Aldred luta

Antes do combate
Se o combate for iminente e ele tiver uma rodada antes do começo propriamente dito, ele conjurará a magia Armadura Arcana, que dura 1 hora e aumenta sua CA em +4. Então, de 21, passa a ser 25. Se ele usar uma ação de movimento para se movimentar, aumenta para 27 graças ao talento Mobilidade.

O combate
Na primeira rodada, se não houver inimigos próximos a um combate corpo-a-corpo ou se nenhum aliado estiver em perigo iminente, ele conjurará a magia Escudo Arcano e se movimentará para perto de um inimigo para estar apto a levar uma bordoada (ele está confiante que sua atual CA o impedirá de se ferir) para na próxima ação ele poder atacar., que durará 1 minuto (10 rodadas) e aumenta sua CA em +4. Então, seria CA 29 ou 31 quando se movimenta.

Aldred gosta de mover e atacar. Não gosta muito de fazer uma investida, mas o fará caso seja necessário ganhar o bônus de +2 nos ataques ou se o inimigo estiver muito longe de seu alcance. Seu ataque básico com a katana é +11 (For 20 devido ao Cinto da Força +2, +1 da katana ser obra-prima, +1 do Foco em Arma e +4 de BBA [Swash 2 e Guerreiro 2]). Seu dano é 1d10+12. Já é bastante forte para um personagem de nível 5, mas ele prefere sempre lutar com Ataque Poderoso. SEMPRE, a não ser que o adversário tenha obviamente uma CA muito alta. Neste caso, ele desfere apenas ataques normais. Se não for visível que o inimigo tenha uma CA muito grande, ele tenta duas vezes com Ataque Poderoso. Se não conseguir acertar, assumirá que a CA é alta demais.

Aldred e seus amigos
Porém, Aldred está com seu bando, o que consiste em receber alguns bônus. Nathaniel costuma conjurar Proteção contra o Mal com Magia Duradoura e Magia Primitiva (gasta poucos PMs) na galera. A CA de Aldred aumenta para 31 ou para 33 se movimentando (e Aldred SEEEEEEEEEEMPRE vai atacar e mover ou mover e atacar ou mover, atacar e mover, graças ao Ataque em Movimento). Castiel gosta de tocar sua ocarina para Inspirar Coragem, dando +1 nos ataques e danos. O ataque de Aldred muda para +12 e o dano para 1d10+13. Ou +10 nos ataques e 1d10+17 nos danos com Ataque Poderoso. Elinia ou mesmo Nathaniel podem lançar bênção, que aumentam os bônus para +13 nos ataques ou +11 com Ataque Poderoso.
Às vezes (muito raramente), conjuram Força do Touro em Aldred e/ou Arma Mágica. Com Força do Touro, Aldred vai a Força 24, com +2 nos ataques e +4 nos danos (graças ao Golpe com Duas Mãos). Com Arma Mágica, +1 nos danos, lembrando que não aumenta o ataque pois a katana é obra-prima e já se vale do bônus de +1 que não se acumula com o bônus +1 mágico.
Poderiam lançar Aumentar Pessoas nele, mas Aldred faz questão de declinar. Ele acha terrivelmente tosco ser um alvo gigante somente para aumentar um pouco sua força.
Imagem Imagem Imagem Imagem Imagem Imagem Imagem Imagem Imagem
Imagem Imagem

Responder

Voltar para “Fan Fiction & Fan Art”