Valkaria
Baixa Vila de Lena.
As tavernas, os teatros, ateliês e guildas de bardos prosperavam no mais boêmio bairro de Valkaria. Apesar de todo espírito livre provocar certa balburdia corriqueira, havia ordem e controle. O Lorde Urbano — casta da mais alta elite que governavam bairros e distritos de Valkaria — da Baixa Vila de Lena se chamava Eugene Ravenclaw, um homem de poucas aparições públicas, mas que era considerado eficiente para que toda a canção dos bardos e os negócios dos mercadores prosperassem com baixos índices de criminalidade. O comando da milícia da Baixa Vila de Lena era o 14º de Valkaria e era consideravelmente honesto e competente, com raros episódios de abuso de autoridade que logo inflamavam a população de aventureiros que viviam na região.
Aventureiros. Pessoas desgarradas da árida vida comum faziam fama e fortuna rastejando em masmorras, expulsando monstros que ameaçam vilas, combatendo cultistas malignos e até mesmo combatendo a infame Tormenta. Estes tipos são comuns pelo mundo de Arton, explorando a escuridão desconhecida enquanto descansam e se divertem nos pontos luminosos das cidades. Porém, Valkaria era um mundo em si, cheio de oportunidade para aventureiros carreiristas, vigilantes mascarados e mercenários.
A Estalagem do Pombo Perneta da Praça era antiga em Valkaria. Começando com um pequeno balcão ao ar livre onde se vendia cerveja barata aos jovens boêmios, hoje era uma construção de dois andares na esquina de duas avenidas movimentadas na Baixa Vila de Lena, logo em frente a um chafariz com a imagem de um antigo guerreiro esculpida na rocha. Era um monumento em tributo a Cyrandur Wallace, um lendário herói colonizador, responsável por fundar diversos reinos do oeste do Reinado e hoje nas mãos do Império de Tauron.
Jovens poetas gostavam de usar os bancos no entorno do chafariz para escrever e declamar suas peças a quem quisesse ouvir, dividindo espaço com alguns mendigos. Os famosos "pombos da praça" usavam a cabeça de Cyrandur como latrina, mas também empesteavam os arredores da pequena praça, sempre encorajados pelos milhos distribuídos pelos idosos que jogavam dama em alguns bancos. Aquele espaço, em frente à estalagem, às vezes servia de palco para bardos não contratados para apresentações espontâneas e que ocasionavam em uma festa não programada. Nestes momentos, a administração da estalagem abria o velho balcão ao ar livre para vender bebida a todos.
Mas o que mais chamava atenção na Estalagem do Pombo Perneta da Praça eram seus clientes costumeiros. Aventureiros. Não se sabe ao certo como isso aconteceu, mas em alguns poucos anos atrás, grupos de aventureiros passaram a usar a estalagem como repouso e a fama do lugar se espalhou pelos três cantos de Arton. As acomodações não eram especialmente luxuosas nem fugiam ao padrão e seus preços também não ofereciam nenhuma vantagem. Ninguém sabia explicar o motivo do sucesso. Alguns diziam que não passava de um modismo, mas a verdade é que já faz quase dez anos que a Pombo Perneta da Praça é conhecida por frequentação de aventureiros. Indivíduos solitários também buscam o lugar para encontrar novos grupos de aventureiros, observando o grande quadro na parede norte, visto logo da entrada, onde dezenas de pergaminhos de contratantes buscam heróis corajosos para resolver seus problemas.
Era noite quando Valkaria, no alto das nuvens, observou com um sorriso felino as peças se moverem em seu tabuleiro mágico. Cinco criaturas, filhas de outros deuses, mas que seguiriam o destino por ela traçado em sua cidade.
***
Tyr saía de mais um dia promissor na filial do Banco de Nilo em Valkaria.. As folhas secas inundavam as calçadas e a rua de pedra iluminada por lamparinas mágicas da noite sem lua. O outono chegara mais frio que o previsto pelos clérigos de Tanna-Toh da Gazeta do Reinado. Aquela noite, entretanto, diferenciava das outras pelo convite entregue por um goblin estagiário de futuro promissor chamado Korn. A carta era do William Davenport, um dos investidores mais importantes do Banco de Tibar em Valkaria e comerciante de tecido, que o convidava para um jantar na Estalagem do Pombo Perneta da Praça.
O jovem goblin estava acostumado aos breves olhares de desconfiança e espanto das pessoas ao verem um goblin vestido como um aristocrata. Nada muito alarmante como em Ahlen, pois Valkaria pulsava diversidade onde o estranho era comum. Mas desta vez, dentro da Pombo Perneta, Tyr sentiu completa ausência de tais olhares. Era mais um no meio de tantos outros. Aventureiros eram tão ou mais exóticos que ele jamais poderia ser.
William estava em uma mesa próxima da lareira, vestindo um elegante gibão de veludo. Seu sobretudo jazia em um cabideiro ali do lado. Quando Tyr se aproximou, ele se levantou para cumprimentá-lo. Um forte aperto de mão.
William era um homem jovem, mas talentoso e precoce chefe de sua família. Parecia ansioso, lutando contra a cautela.
Boa noite, caro Tyr de Nilo. Acredito que não nos conheçamos pessoalmente, mas recebi boas credenciais do senhor Garian Tarlov. Ele é meu parceiro nos negócios e vende em Tharthann produtos meus em uma de suas lojas. Bom, sente-se, por favor. Eu já fiz o pedido, espero que não se incomode.
***
A arte de viver desafiava os conceitos de Buru. As histórias fantásticas de onde viera eram abundantes, mas não satisfizeram o hengeyokai por mais que um punhado de anos. Por isso, Petrynia. Por isso, a estrada. Conhecer as canções, os contos, as crônicas do mundo de Arton parecia ser seu maior prazer. Petrynia era apenas um reino, uma convenção política onde um humano disse ser dono daquelas terras livrando-a dos perigos para que outros humanos ali vivessem. Este era Cyrandur Wallas, o lendário herói de Petrynia, rodeado de lendas, mitos, aventuras. Dizem que além de Petrynia ele foi responsável pelos reinos de Fortuna e Lomatubar.
Buru acabou parando em Valkaria após o fim das Guerras Táuricas. A reconstrução pós-guerra não foi fácil. Seus habitantes o confundiam com um minotauro, tendo que fugir constantemente de linchamentos populares aonde ia. Buru podia simplesmente ir embora, seguir seu rumo e explorar Arton, mas algo o prendia em Valkaria. Era sua pulsante diversidade cosmopolita, o encontro cultural mais incrível que jamais vira ou tivera notícias no Multiverso. Por isso, cinco anos depois vivendo na cidade, Buru perseverou e passou a ser convidado para tocar em tavernas e estalagens quando o ódio aos minotauros começou amansar. Os valkarianos abraçavam o diferente com maior facilidade, embora mantivessem os olhos abertos para o que consideravam "de fora". Com seu carisma e repertório exótico (afinal, ele era de uma raça de metamorfos), conquistou a simpatia de muitos, até mesmo de um jovem nobre chamado William Davenport.
Na Estalagem do Pombo Perneta da Praça, o Buru conheceu William Davenport durante uma apresentação inspirada. Encantado com seu repertório, o homem também pareceu interessado nas capacidades de metamorfosear e em suas histórias de sua terra distante. Vários encontros foram marcados meramente para William ouvir suas histórias. Um dia, Buru recebeu um recado para encontrá-lo na Pombo Perneta para uma proposta. À noite, quando chegou, depois de cumprimentar algumas pessoas que o reconheceram, foi até a mesa onde William estava, ao lado de um goblin trajando roupas elegantes demais, algo que jamais vira antes em sua vida.
***
Oh, Buru, você chegou. Sente-se, por favor. Este é Tyr de Nilo e trabalha com um sócio meu. Tyr, este é Buru, o Minobardo. Ainda faltam alguns convidados, espero que não se importem em esperar para eu contar o que desejo com vocês.
As terras do sul eram especialmente cruéis nas estações frias. Ssizzna jamais acostumaria com a dor nos ossos e na letargia que o frio trazia, mas como uma boa sobrevivente e caçadora, era uma de suas habilidades encontrar meios para se adequar e se adaptar. Para isso, vestia roupas pesadas a fim de manter seu corpo como uma pequena chama dentro de si protegida pelo sopro gélido das montanhas a oeste. A nagah agora vivia em Valkaria, a maior cidade de Arton, um pequeno mundo a parte e ela também encontrou meios de sobreviver.
Rastejava pela cidade envolta em suas roupas, mas mesmo se quisesse manter-se oculta, encontraria muita dificuldade devido ao seu gigantesco corpo e sua cauda escamosa chamativa. Os olhares desconfiados eram conhecidos, mas a milícia não a importunava. Não mais e para isso havia uma história. Ssizzna lembrava de quando tudo começou, de sua montanha nas terras quentes a leste, seu povo massacrado, daqueles que a acolheram para proteger algo sagrado. E como falhou com isso devido à suas fraquezas. Seguia a pista mais recente que encontrara, meses atrás, sobre o terrível grupo: Os Cinco Dissidentes.
Dobrava uma esquina onde crianças brincavam com pequenas espadas de madeira. Subitamente pararam para observar a nagah com seu corpanzil poderoso passar. Ficaram atônitas, ou de medo ou de curiosidade. Mas nem sempre foi assim. Quando chegou a Valkaria na busca pelos responsáveis por sua desgraça, Ssizzna foi rechaçada por onde ia. Hostilizada, não conseguia um lugar decente para passar a noite. Até que um dia, finalmente, veio a acusação de ser uma sszzaazita, uma cria de Sszzaas, o deus da traição. A religião em Valkaria era livre, você podia cultuar um deus como Sszzaas, porém, devido a natureza de sua fé, era quase certo que cometeriam crimes e seriam caçados. O crime de Ssizzzna foi ser uma nagah. Incapaz de lutar por sua vida, acabou na masmorra.
Ficou meses presa na Rocha Cinzenta, lar dos mais perigosos criminosos sob custódia da Coroa de Deheon, até que um dia recebeu a visita de Paollus, um meio-elfo elegante, controlado e inteligente. Ele ofereceu a liberdade e o respeito de sua comunidade se oferecesse a eles algo em troca para que pudessem confiar. E tudo que precisava fazer era se encontrar com certo nobre de nome William Davenport e escutar o que tinha a dizer. Apenas isso. Ssizzna não tinha muita alternativa: era pegar ou largar. Era ficar mofando aprisionada ou atender um pequeno pedido em troca de liberdade para poder seguir seu objetivo pessoal.
E foi assim que uma nagah adentrou a Estalagem do Pombo Perneta da Praça. Seu corpanzil passou pela entrada com alguma dificuldade, mas uma vez dentro, podia manter o corpo ereto novamente, pois o pé direito do estabelecimento era bastante alto para comportar um segundo andar. As pessoas ali, todas em trajes de viajantes, armaduras, mochilas, armas, sacolas e outros equipamentos de aventureiro, sequer a viram como algo exótico. Havia até mesmo um outro nagah por ali discutindo com um grupo de pessoas sobre uma mesa enquanto analisavam um mapa. Súbito, um homem se levantou de sua mesa e acenou para ela. Na mesa havia um grande espaço perto da lareira — e portanto, com o agradável calor — para ela ficar.
***
Você deve ser Ssizzna Ssazz, certo? Ora, seu nome realmente remete ao deus da traição. Eu sou William Davenport... Paollus deve ter falado de mim, certo? Por favor, sen... digo, junte-se a nós, por favor? Estes são Tyr de Nilo e Buru, o Minobardo. Faltam dois.
Disciplina. Treino. Orgo sabia que este era o caminho para aprimorar suas técnicas e conseguir, por fim, seu objetivo final. Porém, era difícil se aperfeiçoar nos treinos. Era preciso de prática, experiência e travar suas batalhas. Desde que conhecera Tyr na Favela dos Goblins, decidiu segui-lo como uma forma de agradecimento e uma forma de trilhar o caminho da espada, uma vez que o goblin dizia ser um viajante para terras distantes. Era um acordo mutuamente satisfatório: um teria um guarda-costas e o outro a oportunidade de lutar e aprimorar sua perícia marcial.
Entretanto, semanas se passaram sem que Tyr o convocasse para alguma viagem. Enquanto esperava, Orgo praticava incansavelmente até que um dia recebeu uma carta de um goblin chamado Korn. O hobgoblin sabia que ele trabalhava com Tyr e pensou que pudesse ser finalmente uma convocação para aventura. Mas era uma carta de outra pessoa. Um tal de William Davenport.
Durante a noite, o samurai caminhou-se para a Estalagem do Pombo Perneta da Praça e foi lá que encontrou, para sua surpresa, o goblin. Além dele, uma nagah de quatro braços dentro de um casaco pesado e um minotauro (?) com cabelos e barba exóticos. Um humano estava entre eles e logo se levantou para cumprimentá-lo erguendo a mão como os moldes do Reinado.
Ele era um homem educado, fino e elegante, além de jovem.
Boa noite, senhor... Orgo, não é? Eu sou o William Davenport. Sente-se, por favor. Estes são Tyr de Nilo, Ssizzna e Buru. Agora falta o principal. A comida logo chegará também, espero que não se importem, pois eu já fiz o pedido.
***
As vezes Chaofan sentia o arrependimento correr a alma. Fazia quase um ano que abandonara sua tribo das montanhas e só encontrou dificuldade em sua vida. Encontrando o tal do Reinado, as cidades humanas ditas civilizadas, Chaofan logo percebeu que eles não tinham prazer em ver um homem-lagarto. A história das escaramuças entre as raças civilizadas e os homens-lagartos das montanhas tem episódios de sangue e saque. Era comum que seus conterrâneos atacassem vilarejos humanos para lhes devorar e roubar equipamentos.
Chaofan não entendia, entretanto, era o que tinha a ver com tudo isso. Ele não ia atrás de saque, mas mesmo assim tinha que fugir de camponeses com tridentes, foices e ancinhos. Houve certa vez que um grupo de aventureiros foi contratado para caçar Chaofan... embora nunca tivessem encontrado seu rastro. E foi assim, em suas andanças que Chaofan lutou e combateu alguns indivíduos revoltados e cegos pelo ódio por sua raça, ignorando o indivíduo que era.
Alguns meses depois encontrou a enorme estátua de uma mulher em súplica para os céu sobre uma imensa cidade em sua volta. Chaofan jamais tinha visto algo parecido, perdendo alguns momentos admirando aquela imensidão. Não podia deixar de conhecer aquela cidade. Foi assim que conseguiu aprender a cultura dos humanos, pois lá não era visto como um monstro à primeira vista, embora alguns problemas chegassem desavisados. Em pouco tempo, Chaofan encontrou um mundo de lutas na Arena Imperial onde poderia lutar e ganhar alguma fama ou glória, mas nunca conseguiu realmente lutar lá. Era um lugar cheio de regras, cheio de obstáculos nos bastidores. Porém, percebendo seu interesse em lutar, acabou conhecendo o mundo das lutas clandestinas, ilegais, durante a noite. Lá, Chaofan pôde batalhas com as técnicas aprendidas por seu mestre.
Até que um dia Chaofan chamou atenção de um homem observador que ia a todas as competições noturnas clandestinas. Ele não disse quem era, mas usava um tapa olho e tinha a pele negra e lhe entregou um papel com um convite. Na noite seguinte, Chaofan não foi lutar, foi à Estalagem do Pombo Perneta da Praça onde ouviria uma proposta...
Ao adentrar no ambiente, foi logo recebido por um humano em uma mesa peculiar. Perto da lareira estava uma nagah de quatro braços, ao seu lado estava um hobgoblin trajando uma armadura pesada com placas de metal, um goblin usando roupas finas e um minotauro com cabelos e barba de humano, traços exóticos do que conhecia até o momento.
Era um jovem nobre em roupas elegantes que puxou uma cadeira para Chaofan sentar.
Aí está, o último integrante. Eu me chamo William Davenport e estes são Tyr de Nilo, Buru, Ssizzna Ssazz e Orgo. Junte-se a nós, por favor, Chaofan.
***
Todos reunidos, William esfregou as mãos com um breve sorriso contido.
Vocês devem estar se perguntando qual motivo para eu reunir figuras tão... notáveis. Bem, eu ganho minha vida com trabalho duro na área dos tecidos, abastecendo várias lojas em todo o Reinado, no Império de Tauron e na Liga Independente. Mas eu também sou o patriarca da minha família Davenport devido ao falecimento de minha mãe recentemente. Meu pai, como vocês devem saber, faleceu nas Guerras Táuricas. Bem, o que importa é que também sou um homem de família e devo respeitar algumas tradições.
Recentemente o Solar Davenport foi assaltado por um... homem-lagarto. Não, não foi Chaofan, não se preocupem. Este larápio roubou uma relíquia antiga da família, uma chave de adamante cravejada por safiras. É um objeto grande, na verdade, uma peça de decoração. Nunca soubemos se ela serve para abrir algo mesmo, mas a verdade é que isso não importa. Eu ofereço a vocês o montante de 1.500 tibares de ouro para dividir entre vocês.
Oh, porque vocês especificamente? Bem, eu tenho meus contatos, sei um pouco da capacidade de cada um de vocês. Além disso, uma de minhas servas viu o homem-lagarto se dirigir em fuga para a Favela dos Goblins. A milícia é inútil pra mim, pois eles tem uma estranha relação com a população daquele bairro. Mandei dois homens à paisana para averiguar o lugar, mas está além das capacidades deles. Os goblins da Favela podem ser muito... hã, como direi... difíceis de lidar. Tyr é um goblin, tenho certeza que tem conexões por lá. Chaofan e Orgo são guerreiros para a proteção. Ssizzna é uma excelente rastreadora e Buru é um mágico.
E então, o que me dizem?
Dados dos Personagens
- Tyr de Nilo <> PV: 24 PA: 1 CA: 22 <> Impostor: 4 <> Orgulho: 1 <> Riqueza: não utilizado <> Contatos: não utilizado <> Virotes: 20 <> Condição: Normal
- Burumyūjishan "Buru" <> PV: 21 PA: 1 PM: 8 CA: 17 <> Música de bardo: 6 <> Condição: Normal
- Ssizzna Ssazz <> PV: 36 PA: 1 CA: 17 <> Condição: Normal
- Orgo Corta-Rocha <> PV: 45 PA: 1 CA: 18 <> Condição: Normal
- Chaofan <> PV: 36 PA: 1 PE: 6 CA: 20 <> Condição: Normal